quinta-feira, 30 de junho de 2022

 Estamos a saque

Tentando fazer de nós parvos, armando uma questão de hipotética confusão no interior do Governo sobre a localização do aeroporto - Montijo ou Alcochete - o certo é que o negócio com a Vinci é mais forte que a defesa dos reais  interesses do País, que não ficam afectados pelo uso de Alcochete, já que no Montijo além de obras onerosas para  criar as fundações sobre lodos profundos para prolongar a pista com segurança, compromete irremediavelmente as condições ecológicas da vida dos habitats de mais de 100.000 aves aquáticas de migração  que ali acorrem anualmente. A RNET faz parte da Convenção de Ramsar pelo valor internacional do seu património natural .

Fui eu quem propôs a criação da RNET em 1976, uma das primeiras Áreas Protegidas a ser classificada  e apoiada em pareceres científicos de ilustres investigadores e para mim é uma jóia da coroa!!

Espero um frémito nacional em defesa intransigente da RNET  contra o absurdo de um aeroporto que poderá  vir a ser palco de tragédias entre as aves e os aviões- depois não faltarão lágrimas de crocodilo.

Isto não vai parar por aqui



 E o Montijo acontece

Estava escrito nas estrelas, agora com maioria absoluta, marimbando-se para qualquer oposição, até neste caso com o apoio do PSD ( se não ás claras, acontecerá em momento decisivo) aí vêm o PS anti- ambientalista e este Governo tecnocrata avançar com o aeroporto no Montijo. E fazem-no com o mesmo cinismo habitual  de quando se quer vender uma coisa à revelia do público,  dizendo que é apenas uma etapa até Alcochete estar pronto - e Alcochete porquê? Que competência tem o Ministro, o 1ºMinistro, o PR,  seja lá quem for, para dizer " o aeroporto vai ser ali"?

Em 2015 Passos Coelho também disse que seria no Montijo, embora não tivesse mandado fazer nenhuma Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) para escolher com base científica  o melhor local - como António  Costa nunca mandou fazer nestes anos todos - o negócio para ser no Montijo manda mais!! 

O impagável anterior ministro do Ambiente, o da voz de trombone, teve o desplante de mandar fazer um EIA para Montijo que deu negativo e mandou fazer outro ( ou os que fossem precisos  até dar "certo"). Se nada mudara, nem as condições geográficas e ecológicas nem o projecto, estavam a passar um atestado de incompetência aos técnicos do 1º EIA?

Parece que entretanto terá sido encomendada a tal AAE - já se sabe o resultado? Esta afirmação do Ministro é nitidamente uma antecipação ou um  atirar de barro à parede para enganar os cidadãos? Então se vão avançar com as obras em Alcochete, não se  pode fazer um esforço maior nessas obras e esquecer Montijo? Vão fazer obras no Montijo para depois abandonar? Está a ser descaradamente um grande cinismo - até parece o Putin a negar qualquer invasão da Ucrânia na véspera de a fazer. Acham que somos todos papalvos - e muitos são e acreditam.

Há uns meses já se suspeitava de que Montijo ia voltar, a  maioria absoluta manda muito, e eu fui um dos que alertou para isso e até escrevi a ONGs a propor que se  manifestassem.

Infelizmente só quando houver um acidente com aves a entrarem pelas turbinas - como na altura foi referido por comandantes de aviação nas TVs- é que vão parar para  pensar e  nada melhor que arranjar dispositivos de tiro repetitivo nos sapais do Tejo e sobre os locais de nidificação para que as aves vão para outro lado. Se elas a saírem, pronto, fica o caso resolvido.

Aeroporto no Montijo e em Alcochete ? Já viu maior disparate e engenhosa maneira de enganar o povinho?!!







sábado, 25 de junho de 2022

 Carta aberta  ao Primeiro Ministro

Esta carta nunca será lida por si, certamente, Senhor Primeiro Ministro, e se fosse  poderia originar um dos seus auto-convincentes discursos em que o Sr, é que tem razão, os outros são todos uns ignorantes e mal intencionados. Mesmo assim aqui fica a carta.

Senhor Dr. António Costa, a sua maioria absoluta veio permitir que viessem ao de cima os problemas graves da governação e eu estou longe de poder julgar com isenção o seu desempenho em aspectos que são manchetes todos os dias;  só na política externa creio haver sinais positivos, já que o Sr. tem levado o País a patamares de algum reconhecimento internacional, em especial europeu; como não faço oposição por simples oposição tenho a liberdade de pensamento capaz de me fazer distinguir o que se afigura acertado ou errado - sem dai eu  ficar à espera de tirar dividendos como fazem todos os Partidos e os seus  seguidores e opositores á esquerda e à direita.  

Mas preocupa.me uma maioria absoluta e musculada com sinais como a política concentracionária de tornar cada vez maior o MAI ( veja lá do que o seu amigo Cabrita foi capaz, impunemente...), que me faz lembrar o Ministério do Interior de má memória,  com as policias todas concentradas...

A situação da função publica é aflitiva; aí, contrário do que afirmam os liberais de todos os quadrantes, não há funcionários a mais, pois creio que ainda estamos longe da média da UE que anda pelos 17%. Há falta enorme na saúde, nas escolas, na justiça, numa rede de vigilantes e gestores das áreas florestais que o Sr, desmembrou... Existe desmotivação  dos funcionários, e a principal razão é esta : não há renovação, ( nas Universidades é preocupante), os que vão ficando sentem cada vez maior a incompetência das chefias principais e intermédias porque estas deixaram de ser nomeadas pela sua competência para serem pelo cartão do Partido-  e como é o mesmo Partido há muitos anos vai-se seguindo as pisadas da mexicanização do Estado - fica tudo nas mãos sempre dos mesmos, uma grande família, Acredite - esta é a principal razão.

Tenho que falar um pouco de mim para esclarecer posições, e declaro que  não sou da esquerda radical antes da esquerda democrática, tendo sido daqueles que, com ingenuidade, acreditei que daquela "madrugada inteira e limpa" de 74 viria um tempo de liberdade séria e transparente, de lealdade, de ética...Houve logo alguém mais velho que me avisasse que não seria assim, que me preparasse para uma luta sem quartel entre os que se atirariam ao pote do Poder. E foi o que passou a acontecer  depois dos dois ou tres primeiros anos de regime novo e esperançoso.

Eu já conhecia países democráticos, passei em França e, sobretudo, vivi largos meses na Alemanha então apenas ocidental, falava e convivia com pessoas de vários extractos sociais e  sabia que havia alguma disputa mas sem assaltos ao Poder;   e se foi  nas lutas académicas em que me envolvi em 1962 onde  iniciei a minha formação ideológica, foi na Europa que eu reforcei essa formação e encontrei na dialéctica entre a social democracia e a democracia cristã alemãs ( ainda um pouco no socialismo democrático francês  que hoje rebentou escandalosamente!!) o meu posicionamento mais conforme com a liberdade, a separação da religião, o Estado Social, a preocupação - já nessa altura - com as questões ambientais.

E em  Portugal o que se parecia mais com esse posicionamento  era o PS. Porém a origem anarco-obreirista ( tal como em Espanha) nunca lhe permitiu, com o avançar do tempo e das ideias, aproximar-se da social  democracia europeia no que respeita sobretudo às questões, que hoje se tornaram imperiosas, da ecologia, do Ambiente e da sustentabilidade do território,  da sua perenidade...

A sua actuação, Sr. Dr. António Costa, no que se refere ao sector primário - aquele que salta logo como imperioso para a sustentabilidade mas que passa despercebido à opinião publica- tem sido desastrosa ao longo dos anos : a gente olha e nem acredita! O Sr. Primeiro Ministro sente-se orgulhoso por ter desagregado o sector agro-florestal,  acha que fez  e está a fazer o melhor para o País? Quem o instruiu nesse sentido? Já me cansa dizer isto, mas desde o direito romano que o espaço rústico é governado através de tres vectores- ager, saltus, silva-  e sempre a gestão do sector agro-florestal foi a chave para se ordenarem as actividades primarias em todo o lado, 

Gostava que dissesse ao povo português porquê e em quem é que se inspirou  para ter a agricultura sob uma tutela e as matas ( digamos florestas...) noutra.  O Sr. Dr. António Costa sente-se orgulhoso por ter extinguido os Serviços Florestais (SF) e tudo ter terminado nas calamidades dos fogos rurais que se sucederam daí em diante? 2017 então é um  marco. Sente-se orgulhoso? Ou julga que nada tem a ver uma coisa  com a outra ?

Em 2017 o Sr, demitiu a Ministra da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa, porque alguém teria de ser o bode expiatório mesmo sendo ela  quem menos culpa tinha. A maior culpa era sua, Sr. Primeiro  Ministro,  por desde  a sua passagem  por aquele mesmo MAI ter desmantelado os  SF e mandado os guardas florestais para a GNR, sendo eles o primeiro escalão dos técnicos florestais que vigiavam e geriam o território florestal TODO O ANO e não apenas a partir de Junho...E o segundo na culpa era o seu excelso ministro  (com m pequeno) do Ambiente "e das florestas" porque não percebia nada do assunto, apesar de, na sua voz de trombone, dizer o contrário. É muito difícil reconhecer que erraram e que seria muito mais eficiente e menos caro reconstruir a estrutura de uma Autoridade Florestal Nacional do que assistirmos todos os anos a estes espectáculos dos fogos, dos gastos multimilionários em combate aéreo  - o único que sabem fazer, ( apesar de terem tantos sapadores e outros agentes). - sabe explicar isto aos portugueses?

Deixaram arder escandalosamente a Mata do Rei, o multisecular Pinhal de Leiria, porque não havia lá um único guarda florestal nem qualquer  trabalhador - um motivo de orgulho, não lhe parece Senhor Primeiro Ministro? Foi ali na Marinha Grande que ainda no século XIX se constituiu a primeira Autoridade Nacional Florestal, depois Serviços Florestais.

Um pretexto já invocado de que sendo mais de 90% da área de matas e matos de privados, não cabe ao Estado ter um serviço para cuidar desse território. Desfaçatez hem? O património natural português, seja publico ou privado, é da responsabilidade do Estado vigiá-lo, orientar a sua gestão e o seu ordenamento nacional, regional e local. É muito difícil de entender ? É como a água que se fosse  possível, já tinha sido toda privatizada; a última grande tentativa conhecida foi no seu primeiro Governo,  com as águas do Algarve, só que os Municípios disseram que não -  para um executivo socialista privatizar recursos naturais é a cereja em cima do bolo da iniquidade.

Desde que Cavaco Silva, com aquela governação de que ele tanto se orgulha ( só ele e mais alguns que lucraram com ela...) pagou uns tostões aos pequenos e médios agricultores para deixarem de produzir ( p.ex., em França devem rir-se à farta) e ainda extinguiu o Serviço de Extensão Rural  ( os grandes produtores da agro-indústria   não precisavam dessa ajuda...) aumentámos a nossa dependência alimentar externa, milhares de hectares de solos foram  sacrificados a eucaliptais e outros milhares ficaram simplesmente ao abandono; nunca se incentivou, com fundos comunitários, a chegada de gente nova ao sector nem a progressão do cooperativismo agrícola. Não temos possibilidade de sermos auto-suficientes em alimentos mas podíamos reduzir em muito a nossa dependência  se deixássemos esta política neoliberal disfarçada  - que agora mundialmente se está a revelar em todo o seu maléfico esplendor - e tivéssemos uma política agro-florestal racional e bem gerida que o Dr. António Costa deve desconhecer o que é e, daí,  nunca alterou em nada a herança de Cavaco Silva e depois da Ministra Cristas - até a agravou.

Recorde-se ainda que os Serviços Florestais e todo o Ministério chegaram a estar inteiramente nas mãos de agentes da indústria da celulose, mas como mesmo assim, juntamente com o ordenamento das Áreas Protegidas (AP) - que tentaram sub-repticiamente integrar se o então Ministro Amílcar Teias não  o denunciasse...- era um obstáculo à livre expansão dos eucaliptais, acabou-se cortando o mal pela raíz- extinga-se !!

Chegámos a este ano com a corda na garganta no que respeita ao problema da água. Mas já desde o seu primeiro Governo que os excelsos ministros que mais  têm a ver com  o problema, Ambiente e Agricultura, diziam que estava tudo controlado, Está ?

Há quem peça a construção de mais barragens - mas se não cai água nas barragens que já existem passaria chover nas barragens novas ? É difícil de aceitar o que investigadores e cientistas, nacionais e internacionais,  vêm avisando há anos e trata-se das tão faladas alterações climáticas  que já deram lugar a excelentes discursos dos seus ministros, tudo controlado e previsto. Mas continuaram anos e anos,  até agora, a financiar projectos de pomares intensivos de olival ( azeite que não fica cá,  que os produtores exportam para Espanha e pouco mais fica cá que uns impostozitos nos Municípios), de amendoal (alimento essencial para a nossa população) ou de abacateiros ( outro produto fundamental em tempos de crise energética e alimentar )- e os pequenos produtores não têm agua para  regar as suas hortas e pomares, sendo que no Norte o drama ainda será maior - tudo controlado, hem?

Há quem discorde, mas as centrais de dessalinização são uma das chaves do problema que se teima por ignorar em Portugal; visitem  aqui a Espanha e um pouco pelo Mediterrâneo  e vejam como praticamente todos os países têm essa forma de combater a escassez de água ( a Argélia tem umas 14 centrais, Marrocos umas 6 ou 7, e por aí fora, certamente tudo países "sem governo..."  Cabo Verde tem água como?  Vão até lá aprender alguma coisa...

Nós temos a maior concentração de população urbana a viver ao longo do litoral oeste e sul, e a consumir água que é gerada no interior - onde as populações não têm outra alternativa e onde ainda se pode fazer alguma agricultura. A água dessalinizada chega hoje a preço de consumo compatível com o uso urbano.


Publicado há uns anos em Portugal no Courier Int.

Acredite, Senhor Primeiro Ministro, Portugal está numa das zonas do Mundo com a maior incidência das famigeradas alterações climáticas - diga aos seus ministros que se deixem de  discursos e façam obra!!

Para isso impunha-se que em Portugal existisse uma Política a sério para a gestão integrada do sector agro-florestal além  (gravidade máxima!) de  uma Politica de Qualidade de Vida  (que na Europa começa a fazer o seu caminho, para nossa vergonha quando até fomos pioneiros) mas aqui nunca será feita por um mini Ministério do Ambiente, com ministros não ambientalistas ( são uns chatos estes tipos do Ambiente, ambientalistas simplórios,  a não deixarem produzir livremente, sempre com remoques), Ministério que tem tanto do que podia estar noutras tutelas mas deixou sair o Ordenamento do Território ( pilar essencial do Ambiente, não sabia, Sr, Dr. António Costa?- ou sabia e assim dá mais jeito?) e tem a Conservação amarrada ás "florestas", como era há 50 anos atrás, tudo dirigido por grandes entendidos nestas matérias, porque apenas têm que seguir a voz do dono  - é  fácil.

Isto já vai muito extenso, mas ainda é preciso recordar o caos nas APs. 

Quando foram criadas as primeiras APs pós 74, Parques Naturais e Reservas Naturais tinham uma orgânica com fins democráticos e pedagógicos; além de um director que representava a política nacional de Ambiente  possuíam o Conselho Geral (CG) onde estavam representados todos os Municípios e Juntas de Freguesia além de serviços regionais e ONGs. Neste CG eram debatidos todos os assuntos e decisões de interesse para a região da AP e por isso podiam estender-se para lá dos seus limites pelas mãos das Autarquias. Pois apareceu um Secretário de Estado, do PS,  numa reunião ( onde eu estava...)  que disse que as APs tinham poder a mais que escapava ao controle nacional, tudo teria de ser controlado no Ministério e arranjou uns iluminados que alteraram a orgânica para aquilo que, até hoje, conduziu à banalização e despromoção das APs - o caos.  Em que País é que já se viram Parques Naturais e Reservas com tanta  dimensão e importância internacional, sem um director que as chefie com equilíbrio?  E o seu anterior ministro do Ambiente teve a desfaçatez de vir,  num jornal, desmerecer dum grupo de conceituados dirigentes de APs e Ambientalistas de credibilidade científica impoluta e afirmar que antes estava tudo errado e agora, com ele, é que estava tudo como nunca tinha estado tão bem !! Que topete, hem ? Por fim para enterrar mais a gestão das APs e revelar todo o  "ambiente consciente" por trás das decisões, o seu Governo  saiu com a vergonha da cogestão das APs - os Municípios que me perdoem, sou convictamente municipalista  mas a politica de Ambiente é nacional e devem ser os responsáveis por cada AP a definir o seu uso. As APs  não se constituíram para parques de recreio mas para proteger a Natureza e a Biodiversidade e eventualmente para terem algum recreio e lazer  -  nunca para turismo. Em termos internacionais é uma vergonha, Quando as APs tinham o seu CG podiam definir, de acordo com o director e as Autarquias, o tipo de uso a ser dado a algumas áreas dessa APs,  agora criar Comissões de Cogestão das APs ( até de Reservas Naturais sensíveis!!) e serem presididas pela Câmara Municipal, brada aos céus !! Nada disto o choca Senhor Primeiro Ministro ?  Entretido com a Europa e com esta criminosa guerra promovida pela Rússia  ( em pleno século XXI!!) o Sr. que nunca ligou ao Ambiente quer agora lá saber destes pormenores...

Senhor Primeiro Ministro, esta carta nunca mais acabaria, já vai quase um testamento e imagine o que, só nestes dois sectores que tenho abordado, ainda haveria por dizer.

Seria uma dádiva dos deuses se fosse dado testemunho pelo Governo, a breve prazo, do que mais urgente há a fazer quanto à economia da água, aos apoios a uma agricultura alimentar que tanta falta nos fez, à preocupação com a Qualidade de Vida e com a gravidade das alterações climáticas;  porque, acreditem os produtivistas, não são balelas de ambientalistas simplórios como disse um patareco que se julga jornalista - só quando abrirem a torneira e não sair água, e quando tiverem de pagar os alimentos a preços proibitivos  para a maioria das pessoas é que talvez - talvez...-  nessa altura tenham receio que o "céu lhes caia em cima"...



















sexta-feira, 24 de junho de 2022

Assim vai o mundo ...até nesta "parvalheira" 

Os EUA no seu "melhor"

O Supremo Tribunal  dos EUA acaba de voltar atrás quase 40 anos e torna ilegal o aborto, graças a tres juízes super conservadores nomeados pelo Trump, com o argumento de que aquela violação da lei da vida não consta da Constituição - constituição com mais de 200 anos!!

É a América no seu momento mais autêntico, não me venham com patranhas de que está a mudar - não muda nada, metade da população sempre foi ignorante, reaccionária, atrasada e essa atitude vem de vez em quando ao de cima. Até um guru neoliberal como Fukuyama, o tal do Fim da História,  em 2019 numa entrevista ao El País, dizia que nunca esperava que uma democracia como a dos EUA elegesse um Trump - farto de saber estava ele  de que o neoliberalismo  desemboca no reaccionarismo, aconteceu ao longo da História; só que mesmo  assim o velho nipo-americano continua a dizer que "não há oura alternativa" senão a economia de mercado livre e desregulado. Os EUA continuam a ser hoje a melhor demonstração do desaire secular das doutrinas que os capitalistas sempre apregoaram e apregoam. 

Lembro-me que na "Volta ao Mundo em 80 dias" o Mr. Fogg e o seu ajudante Passepartout, ao tentarem descer o balão em Nova Iorque, sobrevoaram tantas cenas de tiros entre grupos que Mr. Fogg disse para o ajudante qualquer coisa como  "vamos embora, esta não é terra para descermos". Não mudou nada desde o XIX, é o que conclui.

Crime hediondo

Não é só na América que sabemos de crimes hediondos, só que lá são frequentes, mas até  nesta terrinha eles acontecem.

A criança de tres anos assassinada pela hipotética ama ou seja lá por quem for, é uma coisa inacreditável. Como é que um cérebro humano de uma mulher ou de um homem pode conceber uma atitude tão macabra como aplicar sevícias  a uma menina de 3 anos até ela morrer ??!!






quinta-feira, 16 de junho de 2022

 Sobre a liberdade e a democracia,  liberal, liberalismo, liberalistas e libertinos (continuação)

Vou fazer um resumo das reflexões sobre o assunto, para não tonar esta notas demasiado extensas

O que deve caracterizar a democracia, tal como a sua melhor expressão, a república. é a Ética do bem comum e a defesa intransigente da liberdade. Sou daqueles euro-apologéticos que pensam que  à Europa cabe o papel histórico de fundar e liderar o processo de recuperação e dignificação das instituições democráticas -não por qualquer pretensão de superioridade mas apenas porque a História nos revela que foi na verdade da Europa - e do Sul- que sempre partiram os vectores principais das etapas que foram cimentando o Estado Moderno.

Há na Europa monarquias democráticas em sociedades que conseguiram dar ao poder real uma mera representatividade institucional, mas também não custa dizer que mesmo assim ficando de fora  a eleição do Chefe de Estado, haverá sempre um déficit na representatividade popular. Quantas vezes, ao longo de uma vida,  discuti amigavelmente este assunto com o Gonçalo Ribeiro Telles...

Estes último século XX e o actual XXI são tempos em que, pelas circunstâncias dos avanços nas diferentes formas de conhecimento e pela erosão provocada nos sistemas sociais e económicos, as mudanças se fizeram sentir a intervalos mais curtos.

Uma coisa parece certa, foram as tentativas fomentadas pelo neoliberalismo de desqualificar as ideologias  após o fim da 1ª e 2ª Grandes Guerras e depois do fim da "guerra fria" que voltaram as proclamações da "morte da História".

As ditaduras de direita e de esquerda que dominaram largos períodos do século XX deixaram marcas tanto mais enraizadas quanto menos firmes eram as raízes democráticas das populações e das suas elites intelectuais.

A Rússia, com o seu poderio secular imperialista  conduzido por líderes demagógicos nos discursos e nas acções, adoptou um regime comunista que se afirmou pela força das armas, onde a violência exercida sobre os povos das suas regiões causou milhões de vítimas; e ainda antes dos nazis terem criado os seus repelentes campos de trabalho, grotescamente  sob o lema " o trabalho liberta", já os soviéticos tinham instituído os seus "goulag" na Sibéria, onde apodreceram milhões de russos e de populares dos países por eles dominados.

Mesmo tendo Catarina II chamado para a sua corte filósofos iluministas  como Voltaire e Rousseau ( cujas bibliotecas estão no Palácio de Verão...)para tentar democratizar o imenso país euro-asiático, a oposição dos senhores feudais que dominavam os milhões de servos da gleba não consentiu em mudanças e estas acabaram por chegar violentamente com os soviéticos. Quem visitar São Petersburgo e olhar aquela estrutura de palácios que forma a cidade histórica, percebe porque é que foi ali que se iniciou a revolução bolchevique.

A seguir à guerra que terminou em 1917, os  malefícios  dos regimes liberalistas  de mercado desregulado juntamente com  as dificuldades de recuperação dos países destruídos pela guerra, levaram progressivamente a crises terríveis e ao surgimento de ideologias de extrema direita, com as suas promessas salvíficas e a fé nos grandes líderes. Assim cresceram os fascistas italianos, os nazis alemães, os franquistas espanhóis e os salazaristas portugueses - aqui agora de novo com saudosistas a enaltecerem uns encapotadamente, descaradamente outros, o papel de grande educador dos povos que teve Salazar, exemplo a  seguir por quantos querem uma democracia "melhor" que aquela que temos... Nós precisamos de melhorar dia a dia a nossa democracia, mas sem novo Salazar ou sem ter este como guru...

Já referi a grande crise de depressão dos EUA que abalou o mundo e que desacreditou as políticas que o liberalismo preconiza. Tudo isso culminou  na 2ª Grande Guerra, e após o conflito  surgiram as melhores décadas de paz, do Estado Social,  da liberdade instituída em plena democracia que a Europa já conhecera, quando as governações eram alternadamente da democracia cristã e da social democracia - no fundo com origens diferentes mas com os mesmos propósitos de justiça social, de controle dos mercados e de garantia das liberdades fundamentais.  Ficaram de fora desse período de progresso civilizacional o Portugal de Salazar com a  sua criminosa guerra colonial e a Espanha de Franco com a sua nazificação bem documentada na Guernica.

Insiste-se, o período de maior estabilidade, bem estar e progresso do Ocidente, em especial da Europa, a seguir à Grande  Guerra foi o da  governação  feita pela democracia cristã à direita e pela social democracia à esquerda; o liberalismo ficou na prateleira apenas com  uns quantos pequenos partidos de pouca representatividade. Mas, mais tarde  a queda do muro de Berlim, simbolicamente o fim do poder soviético, renovou um neoliberalismo que voltou a ganhar peso.

Durante a maior  parte do século XX a grande inspiração para se opor ao liberalismo económico-social veio das ideias do inglês John Keynes, que  apresentou  o melhor sistema para aguentar por um lado  o capitalismo sem entrar nos desvarios do mercado livre desregulado, por outro lado da esquerda marxista. Daí a oposição aguerrida  mantida pelos gurus liberalistas e pelos pensadores marxistas, pois o keynesianismo distanciava-se de  ambos.

Realçaram-se porém no campo neoliberal os papeis de Friedman e de Hayeck, este indo mais longe ainda que o primeiro  e tornando-se o consultor e inspirador de Ronald Reagan e de Margaret Thatcher. Para Hayeck . Prémio Nobel em 1974, "a sobrevivência em economia é a dos  mais fortes e mais aptos, de acordo com os êxitos e os falhanços nas suas iniciativas".

Vários economistas famosos vieram denunciar os desvarios que esta política neoliberal acarreta e a globalização neoliberal acabou por  ser revelada, no seu pior cenário, nestes anos de pandemia  e agora com a guerra russa, com a  falta de autonomia das nações  e a dependência dos grandes grupos industriais. O  paradoxo fica aqui bem expresso: o medicamento mais usado para a pandemia e gripes normais, o paracetamol, tem todo o seu princípio activo fabricado unicamente na India, veja-se !!

Dean Rodrick, da Univ. Harvard,  e Joseph Stiglitz. da Univ. Columbia e Prémio Nobel em 2001, foram  dos mais destacados  pensadores do antiliberalismo. Este último escreveu em 2019 que " o neoliberalismo prejudica a democracia há 40 anos."

Um outro guru do neoliberalismo foi - e é ...- Francis Fukuyama, também consultor de Thatcher, que com a arrogância habitual dos liberalistas, aquando da queda do bloco soviético, escreveu o livro "O Fim da História" no qual diz que acabaram as ideologias, o mundo vai voltar a ser apenas o do capitalismo liberal e de mercado livre, ou seja deu corpo em parangonas ao leit-motiv de todos os liberalistas libertinos de sempre, acabaram as ideologia, foi o fim da História.

Foi incensado com a publicação do livro mas depois bastante ridicularizado; mais tarde, em Abril de 2019 numa entrevista que deu ao El Pais acabou por reconhecer que falhara mas renovando a crença no futuro das suas ideias, e que nunca pensara que se desse a ascensão de partidos populistas nas democracias consolidadas; percebia que a Polónia e a Hungria tivessem caminhado no sentido anti liberal mas nunca imaginou que  fosse possível nos EUA eleger alguém como Trump. E, desabafava, a principal causa do excesso do neoliberalismo e das fugas antiliberais  não foi só a queda do comunismo, foi a perda de influencia dos partidos de esquerda democrática por toda a Europa.  Mas  Stiglitz comentou: "hoje... a ideia de Fukuyama parece peculiar e ingénua, mas reforçou a doutrina económica neoliberal que prevaleceu nos últimos 40 anos".

A realidade que o neoliberalismo trouxe às sociedades em que se instalou ( e contaminou de forma especial a União Europeia e as políticas que tem sido seguidas...até à pandemia e agora a guerra russa, veremos a seguir...) é que, quem trabalha para obter maior satisfação das suas necessidades, não percebe que muitas dessas necessidades são continuamente criadas pelo sistema consumista liberal ( que eu designo de  liberalista ou  libertino) em que está mergulhado e os trabalhadores - agora incluindo as classes médias que são motor do desenvolvimento - estão convencidos que pertencem e participam numa sociedade e numa civilização de homens livres- sem perceberem que estão totalmente presos da engrenagem e dependentes das regras que lhes são subtilmente insufladas. Este é o verdadeiro espírito do liberalismo, neo ou não, económico e financeiro que, como a hidra da mitologia quando lhe cortam uma cabeça leva algum tempo a reagir mas surge com várias novas cabeças.

Por isso eu penso, cá no nosso "burgo", em termos de "infecção" social, que mais perigoso que o Chega - epifenómeno alimentado pelo descontentamento popular e que acaba sempre por se desacreditar a si próprio- são os "liberais" que se apresentam  como os grandes defensores das liberdades, os que são perfeccionistas na execução das tarefas. os que falam a linguagem moderna, no fundo os que atraem grande parte da juventude instruída despolitizada  e motivada para melhorar a vida.

E este retorno à arrogância que é fundacional para os liberalistas, é de novo capitaneado pelo velho guru: reapareceu Fukuyama e , em Portugal,  ou me engano muito ou  com fortes  influênciazinhas na comunicação social, numa espaventosa entrevista ao " Publico".

A fé é que nos salva e o mais relevante das suas declarações foi que " as pessoas acabarão por voltar ao liberalismo como a única alternativa", sempre a última e a única alternativa. É nesta fé que a hidra liberalista acalenta o seu regresso, se a Humanidade instruída e amante da verdadeira liberdade (liberdade que é individual mas também é colectiva, da solidariedade e não das esmolas) se deixar de novo enfeitiçar  pelas falsas promessas que, ao longo de quase dois séculos, se traduziram sempre em sofrimento e atraso intelectual para os povos,

Fico por aqui ! Já deu para pensar em alguns dos assuntos que se discutem e para revisitar a História que, dizem, que não se repete - mas há histórias da História tão parecidas com algumas que já aconteceram antes....




sábado, 11 de junho de 2022

 Sobre a liberdade e a democracia - liberal, liberalismo,  liberalistas e libertinos

(Porque quero seguir um rumo metódico do meu pensamento, para meu próprio regalo, vou começar por repetir algumas das coisas que já escrevi antes, para que a minha memória não falhe o alinhamento que quero deixar ficar sobre estes temas nestes tempos fundamentais das nossas vidas -  sobretudo quando  nos aproximamos do seu fim...)


Nós vivemos nas nossas democracias "burguesas" próprias de sociedades liberais, quer dizer sociedades que resultaram da vitória  das ideias liberais sobre as  conservadoras do absolutismo.  Daí passaram a ser considerados fundacionais conceitos como a liberdade individual mas também as liberdades sociais enquanto comunidades humanas,  a supremacia de uma Constituição como lei fundamental dum país, a representação dos cidadãos nos órgãos de governação por voto directo e livre de cada cidadão para a escolha dos seus representantes,  a liberdade de expressão e de reunião, a separação dos tres poderes ( legislativo, executivo, judicial) -  tudo aquilo que a pouco e pouco se foi constituindo  como matriz das nossas vidas individuais e colectivas. Estes conceitos são claros e, com algumas variantes, dominam a governança dos povos democráticos desde a Europa (onde se formaram inicialmente), América do Norte e depois em algumas nações latino-americanas, asiáticas e da Oceanía.

Não é qualquer sociedade que se assume democrática como nós, é necessário primeiro ter uma cultura generalizada e enraizada na maioria da população  e não apenas de elites "ocidentalizadas" as quais não têm peso nos seus países e não aguentam o poder demagógico de outras ideologias massificantes e musculadas, de que são bons exemplos os países do Norte de África, alguns da América do Sul e agora se volta a evidenciar na Rússia.

A Revolução Francesa e o Iluminismo foram o arranque  para a criação do Estado moderno e, apesar de todos os seus excessos, terror, arbitrariedades e demagogia, foi a etapa fundadora das democracias europeias e depois mundiais. Volto a insistir, é um  privilégio  vivermos  neste regime, tão frágil e até ingénuo, que até acalenta no seu seio os vírus de quem o quer destruir - porque essa ingenuidade e essa fragilidade são mesmo as grandes virtudes da democracia, a "virtude" e a "vontade geral" dos filósofos.

Quando hoje se usa o termo liberal isto nada tem a ver, ao contrário do que nos querem fazer crer os auto-denominados liberais que defendem o liberalismo capitalista, regime económico-social que se desenvolveu a partir de meados do século XIX. Ao longo do século XX o liberalismo capitalista foi causa das sucessivas crises da economia e das consequências sociais  que delas advieram. Trata-se de factos, documentados internacionalmente, que não têm uma desculpa para os liberalistas que hoje os neguem.. 

Só para recordar - dando um salto no tempo- quando se deu a grande depressão nos EUA nos anos 30, devida aos excessos do mercados livre desregulado, a sua solução foi dada pelo Presidente Roosevelt com o seu New Deal, quando o Estado lançou milhões de dólares na economia, nas empresas e nos trabalhadores,  aquilo que seria definido por Keynes como a solução para o capitalismo.

De tal forma o liberalismo se tornou um regime eticamente inaceitável pela exploração que fazia do trabalho que suscitou a reacção contrária - o marxismo. Como todos sabemos (quase todos, ao que parece há quem "desconheça"... dos dois lados...) Marx e Engels pensaram um regime completo, uma quase nova religião ateia,  para reger as sociedades industrializadas da sua época, a Inglaterra, a Alemanha e  já um  pouco a França, onde os proletários só tinham como direitos trabalharem e procriarem para produzirem mais trabalhadores.

A situação era tão grave que a própria Igreja tomou posição, como muitos de nós sabemos e os "liberais" de hoje fazem por esquecer: o Papa Leão XIII proclamou a Encíclica Rerum Novarum onde se condena igualmente o socialismo ( leia-se marxismo) e o liberalismo. Fazia bem a muita gente, mesmo não sendo católico, ler aquele livrinho, descontando o tipo de literatura apologética e predical e também a sua época.

Só se vulgarizou o termo comunismo depois da Revolução Bolchevique de 1917, onde o marxismo destinado na sua origem em especial ás sociedades industriais com uma população proletária mais politizada, acabou por ser adaptado pelo leninismo a uma sociedade quase medieval em que o povo rural continuava a ser constituído por servos da gleba. E em vez de democracia passou a defender a ditadura do proletariado, mais uma forma de ditadura...

Por muito controversa que seja a noção, eu aceito o capitalismo  como sinónimo  da existência de propriedade privada e da acumulação individual de riqueza pois  é um fenómeno inerente ao homem desde os primórdios da sua existência. O mal universal do capitalismo,  que derivou desta realidade,  não resulta propriamente dessa realidade e   da sua origem  mas antes do desenvolvimento que ao longo da História lhe foi sendo permitido alcançar.

Uma ilustre historiadora de Arte do início do século XX, Marie Luise Gotheim, explica que, quando o homem começou a sua sedentarização construindo a primeira cabana e semeando as primeiras sementes que colheu na Natureza ( e percebeu como elas  germinavam e produziam novas plantas)n cercou essa parcela em volta da habitação com um bardo ou sebe morta e criou o primeiro jardim, criou a primeira propriedade privada e construiu as suas primeiras ferramentas.

Em Portugal, a quando do início da Reforma Agrária radical no pós 25 de Abril, ficou célebre uma cena transmitida em directo pela TV, na qual os "reformadores" tentam convencer um trabalhador a entregar a sua enxada para constituir um  ferramental colectivo e em que o sujeito se recusa a entregar porque era a sua enxada, havia alguns que não tinham nenhuma e a dele era dele. É este sentido de posse individual de bens que é, a meu ver, inerente ao homem, para lá de outras considerações que se farão a seguir. 

O conceito e uso do termo capitalismo só surge bem tarde, já em pleno século XIX, quando o capitalismo derivou para as suas expressões agressivas de domínio abusivo sobre quem trabalhava e que se  traduziu no liberalismo económico e financeiro. O financialismo  do capitalismo, activado cada vez por maiores grupos exteriores até ao processo económico, foi o pior que aconteceu ao capitalismo e agravou as injustiças do sistema liberalista.

 O uso do termo capitalismo aparece como oposição à sua antítese, o  socialismo.

A senda da Humanidade nos tempos modernos é toda ela uma sucessão de mudanças no sentido de atingir a democracia ou de a destruir.

A oposição democrática quer ao marxismo quer ao liberalismo aconteceu com duas ideologias que foram fundamentais para a estabilidade das democracias: na direita   a democracia cristã, resultante da doutrina social da Igreja depois da já citada Encíclica e na esquerda o socialismo democrático ou social democracia. Vale a pena falar delas.

(há-de continuar...)









quarta-feira, 8 de junho de 2022

A espuma dos dias

António Costa é indiscutivelmente, goste-se ou não dele e do seu estilo de governar, um dos mais complexos políticos que Portugal tem conhecido.  A sua habilidade política porém não consegue esconder a tendência para a manipulação do aparelho do Estado com a ocupação sistemática, passo a passo,  de todos os lugares e cargos mais relevantes pelos seus mais próximos - é que não são para todos os socialistas, são para os que de mais perto o seguem. Este estreitamento da elite politica é confrangedora e a mim, por exemplo, faz-me temer pelos desvios democráticos que uma maioria absoluta pode acarretar. Não acredito na manutenção do diálogo para alem daquilo que não for julgado  fundamental para a ideologia de A. Costa. E é uma atitude preocupante, no sentido de se caminhar para uma  democracia "musculada", o processo concentracionário de fazer do Ministério do Interior -  hoje chama-se da Administração Interna, é só uma questão de palavras... - o super ministério de todas as políticas .

É claro que a vida de  A. Costa não é de invejar quando apanha uma pandemia destruidora do equilíbrio económico-social seguida da guerra que a Rússia programou para aumentar o seu espaço vital, tal como fez o Hitler, e que vai prolongar o estertor da economia europeia e mundial. E é forçoso reconhecer que conseguiu impor o nosso país na UE, que tem sabido contrabalançar o desgaste económico com medidas contemporizadoras - mas consegue-o anunciando medidas compensatórias que aliviam a pressão e depois a pouco e pouco, ao longo do ano, vai cativando as verbas e o prometido...não se realiza. Politico hábil é assim...

Mas onde a governação de A. Costa, no meu entendimento, mais falha é na falta de políticas de médio e longo prazo e em especial as que se destinariam ao sector primário  (agroflorestal) e ao Ambiente no seu sentido lato de Qualidade de Vida. 

O PS é desde a  origem  um partido obreirista,  e não acompanhou a tendência dos socialistas e social-democratas europeus no sentido das preocupações ambientais e de políticas "verdes". Pelo contrário, não me cansarei de acusar  A.Costa por ter desmantelado o sector agro-florestal ( foi ele em 2006 que  transferiu os guardas florestais para a GNR,  1º passo para o fim dos Serviços Florestais de que vamos continuar a pagar por muitos anos, um alto preço ). A. Costa e o PS não entendem nada disto e nem lhes interessa... É uma falha que vai atrasar o nosso país durante décadas.

Eutanásia - É um atraso civilizacional este dos reaccionários que, mais uma vez, se opõem ao processo de descriminalização da eutanásia. As Ordens dos médicos e dos enfermeiros - ou melhor as direcções actuais destas ordens -  ao dizerem que a eutanásia não é um acto médico e ao dizerem que isso afasta os profissionais de saúde de cumprirem a sua ética profissional, estão a passar um atestado de estúpida superioridade a si mesmos  esquecendo quantos profissionais (e eu conheço alguns de grande  craveira) apoiam o processo e é um atestado de inferioridade aos milhares de profissionais dos países onde a eutanásia  já vigora há anos. 

Já foi assim com o divórcio, depois com a legalização do aborto e agora com a eutanásia - o grande  número de conservadores e reaccionários ( de esquerda e de direita embora me pareça que essa "esquerda" seja a mesma que apoia a Rússia nesta guerra...) que proliferam no nosso país acreditam que conseguem travar o tempo - a única coisa que conseguem é, agora neste caso, prolongar o sofrimento de quem não espera outra coisas senão uma morte tranquila. Eu conheci já pessoas nesse estado, incluindo o meu Pai, que nos momentos de lucidez perguntava sempre se para morrer precisava  de passar por aquilo. E ouvi isto e coisas igualmente graves a outros a quem prolongavam a vida para alem do razoável, Os propalados cuidados paliativos  tiram as dores físicas, colocando os doentes em estado de sonolência mas não tratam do sofrimento psicológico de quem esteja consciente e queira pôr fim àquela vida inviável. Conheço grandes médicos de craveira acima da média, que a defendem, por isso todos os homens/mulheres  conscientes deviam fazer a sua Declaração Expressa de Vontade ou um Testamento Vital onde digam o que querem que lhes seja feito se chegarem a uma situação de  inviabilidade da vida. Recusar a eutanásia  é uma  violência e um egoísmo sobre a vontade individual de cada ser humano, ninguém tem o direito de assumir essa superioridade.

 Palavras que mascaram conceitos 

(isto é uma espécie de continuação do texto de dias anteriores, começando por outra ponta...)

Há palavras escolhidas e que entraram no senso comum e que mascaram conceitos, propositadamente é o que eu penso.

Nós vivemos nas nossas "democracias  burguesas" em sociedades liberais, quer dizer em sociedades que resultaram da vitória dos conceitos liberais, sobretudo dos inícios do século XVIII, sobre os conceitos conservadores do absolutismo. 

Passaram a ser consagrados conceitos como a liberdade individual, as liberdades colectivas regulamentadas,  a supremacia de uma Constituição como lei fundamental dum país, a representação por voto directo dos cidadãos para escolha dos representantes do povo para uma Assembleia ou Parlamento, a separação dos tres poderes - executivo legislativo e judicial- enfim, tudo aquilo que a pouco e pouco se foi constituindo como matriz da nossa vida individual e colectiva. Estes conceitos são claros e, com algumas variantes,  dominam a governança ( como agora se diz) dos povos democráticos, desde a Europa aos EUA, a certas nações latino americanas, a algumas  asiáticas e da Oceania.

Não é qualquer sociedade que se assume democrática como nós, é necessário primeiro uma cultura enraizada da maioria da população e não apenas  de elites "ocidentalizadas" as quais não aguentam o poder demagógico de outras ideologias massificantes, de que a Rússia, o Norte de África ou a América latina são bons exemplos.

A " Revolução Francesa" foi o arranque do Estado moderno e, apesar de todos os seus actos de terror, de demagogia, de excessos, depois de assente a "poeira" radical, foi a etapa fundadora  das  democracias europeias e depois ocidentais. Volto a insistir, é um  privilégio vivermos neste regime, tão frágil e tão ingénuo,  que acalenta no seu seio os vírus de quem o quer destruir - porque esta ingenuidade  e esta fragilidade são  mesmo as grandes virtudes da democracia,  a "virtude" e a "vontade geral" dos filósofos que me coibo de voltar a citar.

Quando hoje se usa o termo de sociedade liberal isto nada tem a ver, ao contrário do que nos querem fazer crer os auto-denominados "liberais", com o liberalismo capitalista, regime económico-social que se desenvolveu a partir de meados do século XIX.

De tal forma o liberalismo se tornou um processo eticamente inaceitável de  exploração do trabalho que suscitou a reacção contrária - o marxismo. Como todos sabemos ( quase todos, ao que parece há quem  desconheça ou se esqueça...)  Marx e Engels pensara um regime para aplicar às sociedades industrializadas da época, a Inglaterra, a Alemanha e já um pouco a França, onde os proletários só tinha como funções trabalhar e procriar para gerarem mais trabalhadores.

A situação era tão chocante  que a Igreja tomou posição, como muitos de nós sabemos e os "liberais" de hoje fazem por esquecer: o Papa  Leão XIII proclamou a Encíclica  Rerum Novarum onde condena igualmente o socialismo ( leia-se marxismo) e o liberalismo.  Fazia bem a muita gente ler aquele livrinho, descontando a literatura de tipo eclesiástico ou predical e a sua época.

Só se vulgarizou a palavra comunismo depois da Revolução de Outubro onde o marxismo, destinado preferencialmente a uma classe operária mais politizada, acabou por ser adaptado pelo leninismo a uma sociedade quase medieval em que o povo rural era de servos da gleba.

(Já chega por hoje. Interrompo aqui de novo, mas sei que vou acabar por cair  no libertinismo  ( vulgo liberalismo...)apregoado, entre outros,  por um ressabiado chamado Francis Fukuyama...)







segunda-feira, 6 de junho de 2022

 Pensando no que vai por este mundo...

A guerra Não sendo politico encartado nem sócio de nenhum Partido, mas com um mínimo de informação e de formação, vejo-me a voltar aos mesmos assuntos várias vezes - a guerra que a Rússia impôs à Ucrânia e, por mais que se queira não, não  se deixa de falar  nela directa ou indirectamente.

A guerra contra a Ucrânia neste século XXI, é uma aberração e ainda mais quando, para além dos sofrimentos de qualquer guerra mas com um mínimo de ética, estamos perante uma guerra suja que  escandaliza qualquer cidadão medianamente bem  formado - menos ao que parece os comunistas portugueses e os seus "historiadores", "advogados" "jornalistas etc.

Já se tornou evidente que um ditador como Putin está a usar os mesmos argumentos e os mesmos processos que o Hitler ou qualquer outro facínora já usaram; motivos como proteger as populações russófonas e garantir a sua "área de influência" são os mesmos dos nazis alemães para iniciarem a guerra -  proteger e integrar as populações germanófilas e germanófonas e assegurar o seu "espaço vital." E os mesmos métodos de guerra suja : arrasar por completo as cidades, deixar as ruas armadilhadas com minas anti pessoal,  destruindo tudo quanto é vital e civil ( escolas, hospitais, etc) foi o mesmo que fizeram os nazis e os franquistas em Guernica.

Os tais que são contra o "pensamento único" - o que defende que a culpa é da Rússia e é ela que deve ser criminalizada - querem  a paz (ou  seja a capitulação da Ucrânia) e o fim da corrida aos armamentos, quer dizer que os países ocidentais deixem de fornecer armas aos ucranianos porque assim...a guerra termina e vem a paz. Já se viu maior falta de vergonha, maior hipocrisia ? Só porque na Rússia repousa a herança saudosa das União Soviética que, quem sabe, voltará  ainda a brilhar para "alegria do mundo": e porque preferem o imperialismo russo ao imperialismo americano. Por mim repudio os dois e ao longo dos anos, não vou aqui repetir, manifestei a minha oposição aos vários atentados perpetrados pelos EUA contra outros povos e países. Mas apesar disso eu a ter que escolher prefiro o imperialismo americano que me permite usufruir da minha democracia ( veja-se como ela esteve em risco com  o Trump). E ou o Ocidente ( que também se estende para oriente como o Japão, a Coreia do Sul, a Austrália, etc) ajuda a sério a Ucrânia a ganhar a guerra que ela não provocou, ou teremos  muito maus tempos nos anos que aí virão. Este é um dos casos em que não se pode ficar com um  pé em cada lado, é urgente tomar posição e fixar bem quem são os inimigos da democracia que temos dentro da nossa casa.

Democracia e liberdade - É um privilégio viver em democracia, nesta democracia nascida na Europa, cheia de erros e de vícios mas onde, em cada dia, cada um pode expressar o que pensa e ser responsabilizado se não respeitar os parâmetros da ética - mesmo com os tribunais a falharem tanto...

Acusam, a quem pensa como eu, de euro-centristas, mas os factos são o que são, não se mudam por decisão seja de quem for, os factos acontecem e pronto. E ao longo dos séculos foi da Europa que saíram as luzes de pensamento para iluminar o mundo - é a verdade, pura e simples. E, repito mais uma vez, da Europa meridional.

A democracia ocidental emanou daqui para todo o mundo e nem sequer se pode acusar que foi fruto apenas de colonialismos e outras práticas, porque convictamente penso que, se o colonialismo, apesar de  todos os seus cortejos de injustiças, escravatura e   malefícios, o foi durante a etapa da Humanidade em que essa prática era a norma, por mais hedionda que a encaremos no tempo de hoje. Mas desde que o homem é homem a viver em sociedade que a escravatura como revela o próprio K. Marx, fez parte das fases de construção da economia.

Grave e criminoso foi, como em Portugal com a ditadura do Estado Novo, ter prolongado o colonialismo até ao seu extremo perverso da guerra colonial - quando fomos um dos primeiros a dar o exemplo da descolonização com o Brasil e quando todas as demais nações europeias colonialistas  já tinham,  a seguir à 2ª Grande Guerra, começado  a libertar as suas  colónias.

( Vou parar hoje aqui, mas continuarei a reflectir sobre os temas mais importantes das nossas vidas - a liberdade e a democracia).