domingo, 10 de janeiro de 2021

 Anacronismos e esperança, com a esperança em primeiro lugar...

Saudade - A palavra escolhia como a mais usada em  Portugal durante o ano 2020 foi saudade. Não foi pandemia, nem covid, nem confinamento. Também não estou muito certo sobre  qual o critério usado para seleccionar a palavra - mas essa escolha para mim revela que ainda há esperança. Ela reverte para o essencial da alma portuguesa, porque embora a raiz latina seja solitate,  ela na língua portuguesa significa, desde há muitos séculos atrás, um conjunto de sentimentos muito mais complexos que a simples solidão. Por isso se os portugueses escolheram esta palavra, quando outras nos têm xeringado o juízo desde os inícios do ano passado. é bom sinal, é sinal de esperança.

Chega por várias razões -  Chega de dar vós ao grupelho que tomou este nome e ao farsante que assume a liderança. E a principal razão para o sucesso  que o grupelho e o farsante hoje têm na sociedade portuguesa, é a força que a comunicação social lhes dá todos os  dias,  nos jornais, nos telejornais ou nas rádios.  Basta ele dar um espirro ou debitar uma aleivosia, para dar meia página de jornal ou uns minutos de telejornal, com direito a imagem. Não se trata sequer dum problema de liberdade de expressão, porque outros pequenos  partidos e outros políticos de expressão minoritária não têm uma cobertura mediática  que se lhe compare. Não digo que seja por  coerência ou adesão, mas é certamente porque ao fazer escândalo  ganham  mais audiência mesmo que isso signifique maior audiência a quem é citado e falado.  A democracia  é um regime frágil, a sua condição de dar e   expressar liberdade  exige uma grande responsabilidade e por essa razão há tão poucas democracias no mundo.  A democracia tem que se proteger e se tem que dar notícia de todos os que nela se movimentam, não pode  dar a mesma expressão a uns tratantes que a querem destruir  e a outros que nela se movem com maior ou com menor expressão, mas sem a querer destruir, Essa deve ser a tal linha vermelha que urge que toda a comunicação social assuma como auto censura -  não deixar de noticiar tudo mas dar a dimensão adequada a quem a quer destruir ou a quem não a quer prestigiar. São dois mundos diferentes.

A democracia nos EUA - O assalto ao Capitólio não foi um assalto a um  palácio monumental num país que ainda tem património de pouca antiguidade, o que já seria deplorável - foi o assalto à sede do Poder Legislativo dos EUA. Não me venham com a qualidade da democracia americana, lá por ela, por um fio, ter resistido a um assalto fascista digno de qualquer país do 3ºMundo ou a uma dessas repúblicas leste-europeias que depois do comunismo que as mentalizou durante décadas - não tenham medo das palavras -  não revelam suficiente maturidade democrática para resistir às carícias e promessas dos ditadores encapotados que se aproveitam  da democracia e das suas fragilidades, Não os EUA, que foram criados pela democracia e se desenvolveram sempre nela, embora se possa questionar a conveniência ou inconveniência da estrutura do poder democrático implantado.

Por agora a democracia venceu, mas 75 milhões de americanos votaram em Trump, e mesmo que metade  - e é ser optimista - se afaste agora desta tentativa de destruição do Poder Legislativo, ainda ficam muitos milhões de energúmenos capazes de provocarem fortes convulsões  - e o exemplo de democracia dado a todo o mundo é a pior coisa que se podia fazer a essa DEMOCRACIA. convenhamos.









sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

O mau exemplo dos EUA 

Acabar o que ontem não tive paciência...

A série de acontecimentos que se sucedem os EUA desde as eleições de Novembro para a Presidência têm sido lamentáveis a todos os títulos. Os mais optimistas dirão que a democracia funcionou e mesmo ontem conseguiu-se travar in extremis aquilo que seria a subida do fascismo ao poder na, até agora, mais poderosa nação do mundo; com o fascismo instalado da Rússia, o capitalismo ditatorial comunista ( contra-senso, capitalismo e comunista!!), com outras nações poderosas em modo de fascismo de vários tons como o Irão ou a Turquia, os EUA  têm sido, excepto nos últimos quatro anos, o farol da democracia no mundo. Claro que desde que Trump é Presidente as coisas mudaram e adivinhava-se um larvar fascista em medidas e em tomadas de posição confrangedoras. Porém ontem tinha-se visto o próprio Presidente, que perdeu as eleições (ele que é um perdedor mas não o reconhece e tem triunfado na vida à custa de golpadas  financeiras e crimes  económicos que acabarão  em tribunal  por lhe cair em cima mal ele deixe a Casa Branca), a incitar a populaça a ir até ao Capitólio e a ser forte, porque os "outros" lhes tinham roubado a vitória e só pela força a podiam recuperar. Foi um apelo directo à rebelião, é inimaginável pensar que num país poderoso como os EUA era possível uma populaça de arruaceiros invadir a sede do Poder Legislativo, partir janelas e portas, arrancar mobiliário, roubar peças e sair com elas, entrar nos gabinetes dos deputados e senadores, destruir tudo quanto encontraram - mas aconteceu.

Não vou aqui repetir o que todos sabemos. Mas se não houver um castigo sério e o estupor do Trump sair ileso, poderemos esperar mais atropelos graves à democracia.

Desigualdades do território

Com este título enviei um texto para o Publico, há para aí uma semana. dizem-me que com tanta coisa a sair todos os dias ainda não houve tempo; espero mais uns dias, se não sair entretanto publico-o aqui.

João Reis Gomes

O João escreveu mais uma das suas reflexões sobre esta autêntica tragédia mundial que é a pandemia, estratégia da Natureza que continua a trocar-nos as voltas Aqui vai.

" Do meu ponto de vista

Hoje o Covid 19, amanhã outro com outro nome, o mundo à procura da nova vacina e a pandemia a continuar.

Ao que julgo o que está em causa é a sociedade de consumo-desperdício, utilizadora de uma imensidão de energia.

A ciência diz-nos que ao dispêndio de energia corresponde um certa entropia.

Por definição a entropia é a desorganização do sistema e agora referimo-nos aos Sistema Sócio-Económico em que vivemos.

O psicólogo social romeno Serge Muscovici então director do Laboratoire Européen de Psychologie Social que ele fundou em Paris no ano de 1975, escreveu um livro a que chamou "La Societé Contre Nature" que reprovava o percurso económico-social que estava a ser seguido. 

Queremos então dizer que propomos o abandono  da energia? É claro que não, pois que ela é uma condição  essencial para a produção do trabalho, mas esta tem que ser utilizada com parcimónia. Lembremos que o termo parcimónia agora empregue, quer dizer literalmente que "menos é melhor".

Mais tarde iremos falar da produção de energia.

O que queremos agora dizer é que para uma determinada função, a energia deverá ser utilizada  na menor quantidade possível.

Mas vamos também dizer que esta deverá perseguir uma sociedade ecológica. E então a tão necessária economia?

Vejamos agora a ecologia e a economia. Ora ao analisarmos os dois termos vemos que ambos têm o radical "eco", que significa  enquanto prefixo, lugar (ambiente), que logia se refere ao conhecimento e nomia, do grego "nomos" tem a ver com o pôr em uso. daqui decorre que logicamente  só depois do conhecimentos do lugar, se deve pô-lo em uso. Teremos então que o eco-nómico só o é se for eco-lógico.

Falo agora da energia. O Sol é a fonte de todas as energias e por isso a única razoável. Porém o petróleo é possivelmente o maior negócio do mundo e por isso a tal "sociedade de consumo - desperdício" inicialmente falada, se torna a fonte de grandes negócios de petróleo.

Acontece porém que a pseudo-economia do petróleo é um negócio imparável, mas como o petróleo é um hidrocarboneto o seu consumo vai lançando para a atmosfera anidrido carbónico CO2, que está a ser hoje o maior de todos os males."

João Reis Gomes, Presidente do Instituto Gonçalo Ribeiro Telles da Sociedade Histórica da Independência de Portugal

26/12 /2020







quinta-feira, 7 de janeiro de 2021

 Viva 2021

Viva 2021 e viva eu, que cheguei até aqui mais ou menos safo...

Portugal, na mesma...

Antes de falar nas misérias da América, falarei das nossas que para nós deviam ser motivo de reflexão séria.  A pandemia está  a aumentar e tudo por culpa apenas de todos quantos não ligam importância nenhuma às medidas mínimas de segurança que deviam tomar como prioridade. Ainda esta manhã, enquanto conduzia,  ouvi alguém a denunciar na rádio que entrou num pequeno minimercado e além de estar mais gente do que seria permitido nas dimensões daquela loja, quase ninguém estava de máscara. Outro ouvinte anunciou que entrou num estabelecimento lá da  terra e reconheceu uma pessoa que sabia e ela também sabia que estava infectada mas era como se não soubesse; chamou as autoridades e já estava uma data de pessoas infectadas também. Já se esperava que depois de maiores facilidades dadas pelo Natal, haveria aumento de infectados e só ontem foram mais  de 10.000 - mas porquê? Porque se juntaram famílias grandes, nas mesmas refeições e onde, é claro, se retiraram as máscaras. Depois "aqui d'El Rei" que o Governo é culpado, e responsável por tudo. O Governo é responsável por muita coisa e já falarei disso, mas os maiores irresponsáveis são os portugueses que procedem daquela a maneira, á moda do Trump e do Bolsonaro.

Contra os estados de emergência , que têm sido levantados e repetidos regularmente sem os quais não  é  possível impôr medidas restritivas á liberdade  de circulação e de associação - como se passa e com muito mais rigor noutros países europeus tão ou mais liberais que nós - tem-se oposto alguns partidos e não deixa de ter piada quem é que vota contra : os comunistas do PCP e anexos e os auto-indigitados liberais da IL e o Chega ( chega para lá, nada de encosto). Porque será? Os extremos tocam-se... Os comunistas devem ter medo que venham a ser implantadas as amplas liberdades que eles conhecem ( dizem que conhecem, nunca as viveram, mas eu visitei algumas...) nas democracias populares ( as outras democracias como a nossa, não são populares). Os liberais preferem que não haja repressão a todas as liberdades, que as pessoas mais fracas e mais velhas morram, sempre será um alívio, e que as empresas rebentem, ficando só as mais fortes. Foi assim que o Presidente  Hoover queria actuar aquando da Grande Depressão dos EUA, até chegar Roosevelt e adoptar medidas keynesianas de atirar milhões do erário público para a economia  e o emprego para que  recuperassem.

Neste aspecto, não deixou de ter piada o frente a frente para as eleições deste mês,  entre o Mayan da IL e o João do PCP, quando aquele acusou o comunista de estar a usar teorias do séc. XIX, como se o liberalismo que ele defende não fosse também do séc. XIX. sem tirar nem pôr... E esta, hen?

O Governo - que grandes desvergonhas

António Costa esta certamente muito preocupado com a sua agenda própria, e isso explica que tenha alimentado um Governo de 50 pessoas, com funções algumas vezes duplicadas entre Ministros e Secretários de Estado, e se tenha passado este ano de 2020 na pior confluência de asneiras que se possa imaginar em quase todos, senão em todos os Ministérios. Pense-se na barafunda do MAI, onde se assistiu a um assassínio de um  estrangeiro nas instalações do SEF do aeroporto de Lisboa, e que se chegasse quase ao fim do ano para se saber e rebentar na opinião publica, o horrendo do assassínio perpetrado por agentes à paulada no pobre do emigrante; e só agora se tenha decidido, pelo menos publicamente, em pedir desculpa à família e pagar uma  indemnização - se não tivesse havido escândalo público tudo passaria nas calmas...È o mesmo Ministério em que a polícia e a GNR disputam entre si a escolta às vacinas, como se fossem dois grupos rivais -  e são mesmo, no mesmo Ministério! E o Ministro fica incólume, ou não fosse "amigo do peito" do A. Costa,

O Ministério do Ambiente defende aguerridamente a indústria poluente do lítio, papel que deveria caber a um qualquer Ministério da Indústria, ficando o do Ambiente em guarda e a controlar. Não senhor. mistura-se tudo e com os famigerados Estudos de Avaliação dos Impactes Ambientais. Os mesmo EIA que suportam a implantação de estações fotovoltaicas em cima de qualquer terreno, seja solo agrícola seja mata como na Torre Bela - outra vergonha que dizem bem o que é o actual Ministério do Ambiente e um tal ICN (com F na frente).

Sobre a desvergonha do Ministério da Justiça já me  falta paciência para escrever, tantos são os casos e até de uma Ministra     que parecia incólume a desvios éticos. Mas este caso está mal explicado, aquele Director Geral que se demitiu e assumiu a responsabilidade, num dia disse uma coisa dois dias depois disse contrário. É capaz até de ser ele o verdadeiro culpado da asneira. Mas em cima da presidência portuguesa da UE, alguém quis puxar agora o assunto para um escândalo -. quem terá sido?... A Procuradora Geral, o caso do Tribunal de Contas, agora esta desvergonha da nomeação para a Europa... É este Governo com estes Ministros que vai presidir às políticas europeias durante seis meses ?

A desvergonha do EUA 

Já não posso mais com desvergonhas vindas de todos os lados!! Fica para outro dia



quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

 Para fechar o ano

Apenas umas linhas para fechar o ano 2020, de má memória.

A Pandemia - A Natureza tem destas coisas, mesmo que teorias da conspiração digam que o vírus foi criado em laboratório e deixado escapar pelos chineses, para derrubarem as economias ocidentais, leia-se norte americana, e dominar o planeta. Não é que eles não sejam capazes disso, mas nada de científico comprova essa teoria. Agora que grande parte da Humanidade, cada vez com menos recursos, começa a devorar tudo quanto pode ser comido, incluindo animais selvagens que não tinham até agora grandes contactos com o organismo humano , isso pode ser.

Por cá continuam as asneiras, os escândalos sucedem-se, mas lendo as "Farpas" de Eça e Ortigão, já nessa altura era assim, e prolongou-se -talvez apurando... - até hoje.

Depois dos tiros nos pés do Cabrita, Ministro da Administração Interna, uns atrás dos outros, das falhas graves na Justiça e no Ambiente ( de fazer corar um morto!!), começou em relativa paz a vacinação contra a pandemia, com prioridade para os profissionais de saúde que têm dado a cara e o corpo ao manifesto desde há um ano para cá, com verdadeira heroicidade. Pois há quem diga alarvidades destas : Rui Rio acusa : o responsável pelas mortes em Portugal é António Costa, e mesmo para quem não gosta deste, como eu, dizer alarvidades destas  só pode ser para concorrer com o Ventura do Chega. E para não ficar atrás o grande líder do CDS diz que tudo isto é só show - e dizem estas coisas com as caras deslavadas que têm.

Não deixa de ser curioso que quem se posiciona contra as medidas de confinamento e restrição de liberdades de circulação e de associação , apoiadas na ciência em todo o mundo e que em vários países da Europa são  muito mais rigorosas ainda do que por cá,  têm sido o PCP e os liberais. Tem graça, não ? O PCP deve ter receio que nestes estados de emergência acabem por ser implantadas  as "amplas liberdades" das democracias populares que eles tanto defendem... E os liberais devem querer que as liberdades absolutas arrasem a economia, abatam as camadas da população mais velhas e doentes para recomeçar a boa economia de mercado livre em que eles prosperam.  Como os opostos se encontram, hen?

O planeta e a nova sociedade pós pandemia

Começa a perder-se alguma esperança de que, passado o pico da pandemia e depois de esta ter revelado o estado de dependência, de destruição de equilíbrios naturais e de desigualdades que a globalização liberal implantou em todo o mundo nas últimas décadas, a Humanidade reagisse e começasse uma nova etapa do entendimento que o Homem faz do seu papel no planeta e das suas relações de solidariedade com todos e  em todos os lugares.  Mas a hidra liberal, e os poderosos interesses económico-financeiros libertinos começam a movimentar-se para retomarem  as suas posições. Certamente que haverá nos países mais evoluídos do Ocidente uma  boa parte das populações mais conscientes que se vão bater contra esse regresso ao ante-pandemia. Veremos de  que maneira as duas forças irão enfrentar-se. É matéria para maior reflexão,  daqui a uns dias...






quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

 O que vai pelo mundo e por cá

Por mais incrível que pareça, vivendo numa região turística portuguesa, na Europa e não num qualquer remoto lugar sub-sahariano, voltei a estar uns dias sem internet- a eficiente e "competente" Altice acha que esta zona de fim de rede, onde moram poucos habitantes ( poucos cliente) não merece investimento. Em menos de um mês sucede a mesma coisa - em Novembro estive 10 dias sem internet e  nem vou repetir as trocas de comunicação que então se deram ... Retomemos então a normalidade enquanto a rede aguenta.
1 - 250 anos - 16 de Dezembro, possivelmente, e há 250 anos, em Bona,  nasceu Beethoven, o maior génio  de todos os tempos na música, a música por sua vez mais melódica sem ser  delicodoce e viril e poderosa sem ser  ensurdecedora que já se escreveu. Torna-se quase incompreensível que a maior parte da sua obra, nomeadamente as grandes Sinfonias tenha sido escrita quando já estava surdo, A maravilhosa e empolgante 9ª Sinfonia!- Beethoven nunca a terá ouvido,  a surdez já era quase total.
Quer dizer que a música, as ligações entre instrumentos, a gradação, os timbres, a melodia, tudo isso estava dentro daquele cérebro.
Custa a entender que a chamada música erudita, composta na sua grande maioria na Europa, não seja considerada uma música universal e haja civilizações e culturas, nomeadamente as muçulmanas, que não a cultivam pois tudo o que não seja musica de louvor divino não tem valor para a alma humana. Coisas destas espantam-me, não percebo, até porque há indivíduos árabes ou iranianos, chineses e japoneses, que se tornaram grandes intérpretes e rivalizam com os melhores ocidentais - mas os regimes e as religiões como que boicotam a extensão dessa maravilhosa arte aos seus povos, é  uma tristeza! Eu já passei horas no interior de mosteiros budistas  no Tibet ou no Butão, ouvindo os mantras e as músicas monocórdicas  que forçam a uma introspecção, quais drogas que nos ministram, e é bom - mas toda a vida a ouvir aquilo ? No interior das mesquitas de vários países já tenho estado nos períodos de oração e ouvido uns zumbido musicais  que servem naquele momento, mas mais nada depois... Como é que se pode viver uma vida intelectualmente rica sem ter, pelo menos de vez em quando, umas sessões de boa música de Bach, de Haydn, de Mozart, de  Shubert, de Chopin, ou de Méssian - ou de Beethoven? Somos capazes de imaginar estarmos por cá a ouvir apenas o cantochão ( que é muito bonito) e  as orações musicadas das igrejas cristãs?  Como a inteligência é igualmente universal entre todos os seres humanos de todos os povos e culturas, uma das questões com que me interrogo muitas vezes é porquê a arte fica tão limitada nesses povos e nessas religiões que são autenticamente castradoras da personalidade dos seres humanos - até porque, como já disse, dessas mesmas partes da humanidade saem grandes intérpretes das chamadas artes ocidentais. Não me venham com a história do eurocentrismo e da supremacia racista branca, se o ocidente europeu se desenvolveu mais neste sentido é porque houve alguma razão para isso - nada tem a ver com supremacia cultural, antes certamente económica que mais depressa se generalizou a todo o mundo. Estamos agora a assistir ao expansionismo chinês mas se quisermos ser bons observadores veremos que eles o que fazem é servir-se habilmente dos valores ocidentais e pouco nos transmitem dos seus valores próprios, para além dos dragões  nas danças rituais... Onde já vou só porque celebro hoje os 250 anos de Beethoven!

 Na minha pequena sala de estar, que é assim por decisão própria e por  apreciar o intimismo das pequenas velhas casas rurais,  existem 3 retratos ( eu que não sou muito dado a heróis) : um busto do Eça de Queirós ( como um Eça faz hoje falta neste jardim à beira mar mal plantado!), uma fotografia do Fernando Pessoa (com quem a alma humana atinge uma espécie de estratosfera) e um retrato ( por sinal de má qualidade) de Beethoven. 

O "Concerto para violino e orquestra" é  sublime, se alguém não conhece faça o favor de tentar ouvir e deixe-se extasiar.


2- 120 anos
Eça de Queiroz - está a chegar ao fim o ano em que comemoram os 120 do seu falecimento e seja pela pandemia, seja pela habitual inércia cultural e intelectual portuguesa para além do que seja o pequeno diz-que-diz  quotidiano, quase passou despercebida esta comemoração. Agora querem transladar os restos mortais para o Panteão . Vá lá, apressem-se porque o ano está a chegar ao fim...

3 - O Estado criminoso 

A morte do ucraniano, assassinado às mãos de tres agentes policiais do SEF, em instalações do aeroporto de Lisboa, é um crime  perpetrado pelo Estado português, por agentes do Estado, actuando em nome do Estado que se torna assim um Estado criminoso.
A gente pasma como é possível que isto aconteça e que só agora, nove meses depois, porque saltou para as primeiras páginas, vem o Governo bradar aos céus que uma coisa destas não podia ter acontecido. E o próprio MAI a dizer que não há indícios de outros crimes destes terem acontecido porque os inquéritos nunca assinalaram mortes ilegais. Mas estão a fazer de nós parvos ou quê? Então o primeiro relatório do incidente da morte deste ucraniano não diz também que tinha sido uma morte acidental? O investigador chefe olhou para o vídeo gravado na altura, falou com os tres energúmenos seus subordinados e não encontrou motivos para perceber que a morte tinha sido violenta e provocada por mero ódio ? Todos os anteriores relatórios sobre violência praticada nas catacumbas do aeroporto, que atestaram nada de muito grave, podem ser falsos como este também era!
E o Ministro acha que cumpriu o seu dever e nem sequer por vergonha - que ele disse que sentia - nem por isso  se demitiu . E o Primeiro Ministro por muito que lhe custe ver atingir amigos do peito e  por coisas deste calibre,  por muito que lhe custe, devia ter a dignidade de lhe pedir ( ao menos pedir,,,) que se demitisse. Por uma gravidade  diferente se demitiu a anterior Ministra, quando os incêndios rurais tiveram como causa principal a falta de  uma política florestal adequada e a falta de uma organização nacional de defesa e gestão da floresta de que ela não era culpada e de que o  próprio dr. António Costa  é  grande responsável, por ter dado a machadada principal nos Serviços Florestais, Pouca vergonha a mais.
4 - As eleições presidenciais
Quase ninguém vai dar pelas eleições presidenciais, dado este clima de temor pela  pandemia em marcha. Coisa que não preocupa nada o actual Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, autêntico suporte dizem a direita mais extremista e a esquerda em geral dos Governos do PS pela simples razão - disfarçada  sempre pelo "interesse nacional" - de que precisa dos votos socialistas para ser eleito sem problemas. Mas é evidente para todos que o segundo mandato de Marcelo não vai ser igual ao primeiro, e ele que é estruturalmente da direita vai fazer tudo para desgastar  o PS e abrir a porta à direita  mesmo, como já admitiu, que isso signifique aceitar o Chega. Ora não ! É evidente também que António Costa sabe muito bem que será assim mas ao seu próprio programa de vida não interessa, tem outros horizontes em vista e que quem  cá ficar que se aguente...
Não deixa também de ser curioso que toda a gente se preocupe com o Chega e com André Ventura, em especial a comunicação social que os traz ao colo e é a comunicação social a principal responsável pela publicidade feita àqueles dois expoentes da direita extremista. Parece que não querem ver - ou vêem e fingem que não - que o Ventura é um bluf, sem cultura política nem convicções de direita radical, bem falante e chico-esperto com certeza,  o que ele tem é um enorme apetite e uma excepcional capacidade de ir buscar os assuntos mais contundentes para apoiar. Não se nota nele - eu não noto, talvez seja falha minha... - grandes convicções ideológicas o que se nota é o  sábio aproveitamento de tudo quanto possa cair bem na grande massa de portugueses iletrados e/ou pouco ou mal formados ideologicamente, que querem ver as suas causas resolvidas Digamos que ele é um Trump em ponto pequeno e à portuguesa, 
Agora com quem  ninguém parece tomar atenção e é muito mais perigoso em termos ideológicos são os liberais acantonados (apenas alguns...) na IL. Esses são convictos e sabem que tipo de sociedade querem ; o mercado do laissez faire, laissez passer, o assistencialismo aos mais pobres e o recurso à saúde  privada equiparado à publica, para a livre escolha; claro  que só os ricos têm essa capacidade de escolha. Mas depois o Estado paga aos pobres para irem ao privado -  IL e os seus até agora apagados sequazes esses sim são perigosos -  é bom saber-se quem são e onde estão...

5- Democracia de novo assegurada nos EUA
A autêntica palhaçada que têm sido as eleições presidenciais nos EUA está a chegar ao fim, por agora. Virem dizer que os EUA são o exemplo e o farol da democracia no mundo - vão cantar essa loa lá para a China ou para a Arábia Saudita, aí  devem gostar...
Que a vitória de Biden não faça esquecer que 70 milhões de americanos votaram no maior idiota, mentiroso e  mentecapto  que o Ocidente já conheceu. 
E o sistema de eleição em que deixam de contar os votos da sempre válida  lei "um homem um voto" para contar uma eleição de um colégio eleitoral que pode falhar na última hora,  com uma Justiça que por pouco falhou  face aos assaltos que Trump lhe encomendou, não é exemplo de democracia para ninguém.
Com Biden pode ser que alguma normalidade volte ao Ocidente e que a figura dum louco e desvairado deixe de ser exemplo para outros tantos títeres deste mudo em convulsão.
6-Brexit
Finalmente o desacordo entre a UE e a GB está a chegar ao fim,  Sem acordo em assuntos fundamentais para a economia, eu acredito que virão muito maus tempos para os britânicos. Claro que os principais responsáveis são os ingleses, convencidos com a sua Rainha de que ainda têm o Império quando governavam, punham e dispunham no mundo inteiro. Talvez os escoceses lhes dêem a volta...







terça-feira, 1 de dezembro de 2020

 A espuma dos dias ...

1 - O 1º de Dezembro

Em 1640 recuperámos a independência,  e pena é que a Catalunha na mesma altura tenha sido sacrificada ao jugo castelhano.  Teríamos uma Península Ibérica muito mais equilibrada e pujante, se em vez de ser só Portugal independente ao lado do vizinho gigante,  tivéssemos também outras nações com cultura e identidade próprias como é o caso do País Basco.

Comemorar o 1º de Dezembro é ajudar a relembrar a luta de quase 900 anos deste pequeno povo esclarecido e por vezes genial, que superou dificuldades  século após século que teve a capacidade de entender o Renascimento e daí lançou a epopeia das descobertas pelo mundo fora.  Olhar a História com os olhos de hoje, como querem fazer certos  intelectuais de pouca sustentabilidade mas ávidos de  protagonismo , é  um processo redutor da Humanidade; podemos hoje discordar de métodos e processos usados pelas gerações de há séculos,  sim senhor, ninguém hoje sustenta a escravatura, a violência racial e outras praticas que se propalaram  nos séculos anteriores. Mas a escravatura existe desde que o homem é homem, em todos os povos e em todas as culturas, até escravatura de seres humanos das mesma etnia ou próxima ( o clássico exemplo da Rainha Giga de Angola, que lutou contra os portugueses mas ela mesma tinha centenas de escravos negros ao seus serviço é significativo...)  - por isso devemos lamentar também termos estado envolvidos nessa prática desumana - mas ainda não vi nenhum chefe ou lidere africano pedir desculpa aos seus concidadãos por os antepassados terem vendido os seus irmãos ao comerciantes  que chegavam com as caravelas  até às praias. Peçam lá desculpa, vá!!

Por isso temos todas as razões para nos orgulharmos das nossas façanhas e da nossa História, sem que daí possam nascer nacionalismos e xenofobias espúrias.

 2 - Eduardo Lourenço, da colheita de 1923

Faleceu hoje Eduardo Lourenço, pensador e  escritor  de grande gabarito, talvez um dos maiores senão o maior e mais profundo pensador dos séculos XX e XXI. Morreu com 97 anos,

Aqui há uns anos o Arqº Nuno Portas disse que os anos de 1922 e 23 foram de "grandes colheitas" em termos do nascimento de homens de elevada craveira intelectual. Na verdade, e certamente vão faltar alguns nomes, dessas colheitas fazem parte Gonçalo Ribeiro Telles, Nuno Teotónio Pereira, Fernando Távora, Eduardo Lourenço, ou Adriano Moreira


3- A crise que se aproxima - Creio sinceramente, como já foi  afirmado por alguns especialistas, que o próximo ano será de uma enorme crise em todo o mundo e nós seremos dos mais afectados, pela pequena dimensão da nossa economia e pela sua dependência do comércio externo. E muito perigosas serão a crise social e a crise politica inerentes, com o rol de desempregados, de falências de empresas e de agitação social . Serão os tempos dos populismos e do crescimento dos extremismos que hoje já não serão, sejamos claros, da esquerda mas antes os da extrema direita.  Já ninguém, nos países ocidentais pelo menos, espera que comunismos e  radicalismos de esquerda venham   a dominar seja lá onde for,  porque as sociedades  ditas burguesas já não toleram a tenaz do capitalismo de Estado.

Já tenho dito que a História se repete se nós  deixarmos que ela se repita, e o que aconteceu depois da pandemia da pneumónica, em 1917- 18 foi o crescimento exponencial, ano após ano, dos ideais fascistas e ditatoriais precisamente tirando partido das dificuldades das camadas mais desfavorecidas. As políticas dum liberalismo financeiro exacerbado, explorando nas fábricas e nas cidades superpovoadas os trabalhadores e a própria classe média que despontava, levaram a enormes desigualdades entre países e em cada país entre os diversos estratos das suas  populações. A  grande crise do  liberalismo sem regras que atingiu os EUA no final da década de 20, foi agravada com as decisões do então Presidente Hoover e dos seus conselheiros financeiros sobre um Estado menor, de que valia mais deixar rebentar a economia, deixar falir as empresas que não aguentassem a crise,  para depois se poder reconstituir de novo a economia de mercado. Essa decisão agravou a crise até ao limite e começou a sentir-se a sua repercussão nos países europeus. 

Foi então que eleito o Presidente Roosevelt, que adoptou uma política inversa, depois esplanada e teorizada  por Keynes, que foi a injecção maciça de investimento público nas empresas e na sociedade, graças à  reconstituição de um Estado forte.

Mas a falência das economias europeias prosseguia, a Inglaterra, a França, a Itália e em especial a Alemanha viviam anos de grande  dificuldade económica e a pobreza aumentava. O nazismo deu  resposta aos anseios da população mais desfavorecida, não foi por acaso que se intitulou Nacional Socialismo e Hitler chegou ao Poder  ganhando eleições livres, desde logo usando tácticas e métodos  de terror público que parece não terem feito recuar a maioria dos alemães que esperavam por um futuro melhor - o resultado da guerra demonstrou que foi um engano terrível.

Na Itália nasceu o fachismo de Mussolini e na Península Ibérica os proto fascismos franquista e salazarista; noutra economia relevante no Oriente, o Japão, sob a capa fanática do Imperador, nasceu o feroz nacionalismo nipónico que só Hiroshima e Nagasaki haveriam de  destronar.

Nesta ano da nova pandemia os EUA voltam a estar na linha da frente do grande  desastre mundial. desde que a percentagem mais estúpida por um lado dos americanos menos cultos  e por outro lado dos manipuladores  da economia de mercado e das religiões extremistas, muitas vezes associados, enviaram opara Presidente o paranóico e sem escrúpulos Donald Trump. O seu posicionamento e as suas ideias  anti democráticas têm servido de exemplo e de estímulo aos protagonismos da direita reaccionária um pouco por todo o mundo.

O comportamento de alguns países da União Europeia é bem demonstrativo como as influências das ditaduras em povos mal preparados para a democracia, deixam resquícios altamente perigosos em termos civilizacionais para todo o continente europeu e - eu continuo  a ser eurocentrista... - para todo o mundo .Veja-se a dificuldade que alguns países que estiveram décadas integrados nas ditaduras comunistas eufemisticamente designadas democracias populares ( quem as visitou como eu, viu como era,,,) em aceitarem as regras da democracia liberal ou "burguesa" a ponto de, casos da Polónia e da Hungria, porem em risco a disponibilidade de fundos europeus para acudir à pandemia. Aqueles povos, depois de umas primeiras experiências democráticas a seguir ao  desabar do Muro Berlim ( que o PCP português diz que não foi nada...) deixaram-se voltar a seduzir pelas ideias  mais extremistas e  antidemocráticas de salvadores da Pátria. Esses dois são os mais explícitos, mas noutros países da Europa oriental a estabilidade democrática como a conhecemos por  aqui está sempre em risco.

Estamos num desses tempos de encruzilhada e devemos estar preparados para rebater todos os sinais de ameaça para a democracia que não é "orgânica" como queria o salazarismo nem "popular como querem  (ainda hoje !...) os marxistas leninistas ou trotzequistas  ou maoistas ou sejam á o que  forem - é a democracia  de origem liberal e burguesa, sim senhor, mas moldada  aos valores da solidariedade e da defesa do colectivo e de um Estado Social forte para poder acudir, como nesta pandemia, às necessidades prementes da economia e dos cidadãos. Veja-se como agora os autodenominados liberais pedem que o Estado intervenha, que ponha dinheiro nas empresas, que ajude o mercado a funcionar...  Menos Estado para melhore Estado, não é ? Pois, foram das crises, claro.







segunda-feira, 23 de novembro de 2020

 Ainda Gonçalo Ribeiro Telles


Quando vinha de Lisboa para o Algarve, naquele fim de  tarde depois da saída do funeral dos Jerónimos, foi quando caí em mim, como se levasse uma grande pancada : nunca mais voltaria  a subir as escadas da Rua de S.José ! Durante os últimos 4 ou 5 anos, e  de forma quase semanal nestes últimos meses em que o Gonçalo piorou e estava isolado de visitas ( permitiam a mim, fora da família,  que o visitasse), estive com ele, assistindo a uma lenta e progressiva agonia, com cegueira, com quase impossibilidade de falar - mas consciente, mesmo debaixo da sonolência que os  sedativos lhe provocavam, ele reconhecia-me e prestava alguma atenção ao que eu dizia só para o manter ligado.  Acabou o meu empenho em continuar a escrever sobre este velho e grande Amigo.

No entanto, por solicitação insistente, acabei por escrever o último artigo em memória do Gonçalo, que veio publicado no Jornal de Letras. Mas acharam por bem ( acharam eles, sem me dizer) que deviam cortar algumas frases, o que acho intolerável.  Por isso aqui vai na íntegra.

Gonçalo Ribeiro Telles, o Homem, o Mestre

É fácil e é difícil escrever sobre Gonçalo Ribeiro Telles.

Fácil porque todos o conhecem e sabem muito daquilo que ele construiu ao longo da vida; difícil para não cair nos lugares comuns estereotipados que são sempre utilizados nestas laudas.

Antes de abordar o Mestre vou tentar abordar o Homem com quem convivi com intimidade quase 60 anos, mas tenho de falar de mim porque, depois de tantas personalidades terem escrito sobre ele,  essa é a única razão para eu poder escrever  estas linhas sentidas. Foi meu Professor coadjuvando o Professor Caldeira Cabral e, para meu espanto, habituado a ver o Estado Novo perseguir republicanos e comunistas, ele - católico e monárquico - foi expulso do ensino! Foi também expulso da Câmara Municipal de Lisboa por uma exemplar questão de ética profissional ligada ao seu projecto para a Avenida da Liberdade.

Numa das últimas aulas que deu convidou-me para ir trabalhar no seu atelier e também para eu aparecer nas noites de quarta feira no Centro nacional de Cultura, onde se discutis Cultura e Liberdade. Para as gerações de hoje isto talvez pouco diga, mas era precisa coragem para aqueles homens e mulheres de grande valor se posicionarem, daquela forma, e naquele lugar, ali mesmo pegado com o quartel da PIDE.

Gonçalo Ribeiro Telles afirmou-se sempre como "monárquico popular" mas alinhou durante décadas com a oposição republicana ao regime. As suas convicções monárquicas, que eu não partilhava,  mas inspiradas em valores da Cultura e da Tradição, contribuíram decisivamente para alargar os conceitos de democracia e de convivência democrática nos ideais da Liberdade.

Basta dizer que em 1973 foi convidado a participar, mas impedido de o fazer, no 3º Congresso da Oposição em Aveiro, onde apenas  conseguiu chegar o dr. Henrique Barrilaro Ruas que leu a sua mensagem, mas a presença dos monárquicos foi possível depois do Congresso ter deixado cair a designação de Republicano para passar a ser da "Oposição Democrática" - o que só por si também diz muito do prestígio e da consideração que Ribeiro Telles já então granjeava.

Recordo-me de, em 1959, ele ter sido incomodado pela PIDE, instaurando-lhe um processo e tribunal, por ser signatário duma Carta a Salazar ( de que tenho ainda uma cópia) que partiu de um grupo de católicos progressistas encabeçada pela grande figura do Padre Abel Varzim, que incluía outros sacerdotes e personalidades da craveira de Francisco Sousa tavares, do hoje tão esquecido José Escada, João Bénard da Costa, Sofia de Mello Breyner, Nuno Teotónio Pereira e outros.E constava do documento da acusação que ele "tinha custeado a impressão da carta e sua distribuição"...

Como dirigente dos monárquicos independentes e populares  participou nas diversas eleições que se organizaram, em 1958 integrou a candidatura de Humberto Delgado e em 1969, por convite de Mário Soares, participou nas listas da CEUD através da Convergência Monárquica que chegou até 1974 - tudo o que significasse democracia e liberdade dizia-lhe respeito.

Por mim, que deixei de o ter como Professor no ISA, continuei a tê-lo no seu atelier e tenho recordações incríveis desses anos. Eu, republicano, passei a ser um dos seus mais dilectos discípulos e as nossas conversas sobre politica e sobre tudo o que nos rodeia, ao longo de todos estes anos, apenas cimentaram  uma enorme amizade e uma grande, muito grande, compreensão da minha pare pelo se génio. Porque é de génio que se trata.

A sua invulgar capacidade intelectual, revelou-o como criador de de paisagens e como inspirador de ideais democráticos, pois para Gonçalo Ribeiro Telles tudo se conjugava numa concepção global da paisagem, dos homens, do património natural explorado para dele se edificar o património construído- tudo se conjugava numa grande IDEIA comum. 

Todos têm falado dele em 1967, quando ocorreram as trágicas cheias da região de Lisboa que provocaram centenas de mortos e cujo número o regime tentou encobrir.  Nessa data, à personalidade de homem politico Ribeiro Telles veio tornar pública  a sua qualidade de grande técnico, a afirmação  de Mestre, surgindo inesperadamente na televisão a explicar as razões que tinham dado tal dimensão às chuvadas anormais que haviam caído na região. Denunciou a ocupação dos leitos de cheia e das cabeceiras das bacias hidrográficas pelas populações desfavorecidas e apontou o dedo à falta  de políticas de habitação, de apoio social e de ordenamento do território; falou de conceitos e de uma terminologia técnica que hoje nos são familiares mas que, na altura, surgiam como novidade para muitos  técnicos e sem dúvida para a opinião pública.

Com os 25 de Abril de 74 Gonçalo Ribeiro Telles, já então Presidente do PPM - Partido Popular Monárquico -  foi chamado para Sub-Secretário de Estado do Ambiente, passando depois a Secretário de Estado da mesma pasta. E teve o "desplante" de me convidar para seu chefe de gabinete, eu que sempre fui republicano e avesso ao activismo politico - mas a ele não fui capaz de recusar.

Gonçalo Ribeiro Telles depois de ter saído do VIº Governo Provisório, voltou ao ensino universitário em 1976, para a recém criada Universidade de Évora, construindo o Departamento de Planeamento Biofísico  que englobava  as licenciaturas em Arquitectura Paisagista e Engenharia Biofísica e que ele dirigiu até á sua jubilação.

Mas não abandonou a intervenção politica, participando como deputado na Assembleia da República pelo PPM integrado na AD e masi tarde como deputado independente elo PS.

Por trás do Homem, democrata, íntegro, espírito impregnado dos melhores valores humanos e colectivos, que lutou sempre pela liberdade e pela coesão social, para lá de ideologias catalogadas, estava pois o técnico, o visionário, o Mestre.

Foi entre 1979e 1983 que Ribeiro Telles teve a mais importante contribuição da sua vida para a consolidação da Política de Ambiente e de Ordenamento do Território, dando dela a verdadeira imagem pública  que já era  respeitada por todos quantos com ele privavam. Foi Ministro de Estado e da Qualidade de Vida e ainda hoje, apesar dos atropelos, das (in)correcções, das incompetências, das submissões a valores mercantilistas tornados mais importantes que a verdade das Ciências da Terra, a Política de Ambiente em Portugal assenta na legislação que saiu da sua vontade política : e não vou repetir o que já se escreveu sobre a sua acção nesses domínios.

Chamado por vezes  de utópico e idealista, nunca se afastou da realidade que é representada pela  Vida, quer no espaço rural quer no espaço urbano. Terçou armas para que paisagem urbana e paisagem rural fossem entendidas apenas como duas faces da Paisagem Global. em que a Natureza esteja presente e em que o homem tire dela proveito sem a prejudicar - hoje todos lhe dão razão por ter insistido quase obcessivamente na importância das hortas urbanas e dos corredores verde. Pôde ainda assistir à concretização duma sua "utopia" lisboeta, o corredor verde entre o Parque Eduardo VII e o Parque de Monsanto..

Utopia com os pés na terra- define bem a sua postura.

Batalhou sempre a favor do conhecimento e do respeito pelo genius locci de cada lugar - e lançou os primeiros impulsos mediáticos a favor do equilíbrio das paisagens, da defesa da Biodiversidade, do respeito pelas leis da Natureza semn fundamentalismos porque essa é também a ideia magna da arquitectura paisagista - a arte e a ciência de ordenar o espaço em relação ao Homem, com respeito pelas leis naturais da Biosfera. Foi assim o Mestre de muitas gerações.

Acompanhei Gonçalo Ribeiro Telles nos últimos anos em que aguentou um sofrimento físico e psíquico impressionante, como impressionante foi sempre a sua resiliência até ao último sopro - com 98 anos feitos.

Não basta dizer que Portugal tem uma grande dúvida para com ele - é preciso e urgente que alguém tenha a coragem de implementar as suas ideias sobre o território e a paisagem, única homenagem digna do Mestre que ele foi.