quarta-feira, 20 de outubro de 2021

 

  Ordenamento do Território

Politica de Conservação - Ambiente

 

Uma das preocupações de um Governo de esquerda democrática deverá ser renovar JÁ  a Política de  Ambiente que se  tornou num simples ornamento da composição  do Executivo, afectando a integridade e o futuro do território.

     Continuo bem convicto de que uma Política de Ambiente é fundamental aqui como em todo o mundo e particularmente na Europa  e em especial num País desorganizado como o nosso, o que exige uma estrutura governativa forte, esclarecida e eficaz e dirigentes convictos e que não estejam apenas a fazer currículo e a ganhar posição para outros voos políticos.

Fundei e fui o primeiro Presidente do Serviço que antecedeu o actual ICNF, por isso creio ter ideias firmes sobre a Politica de Conservação, que tal como a do Ordenamento do Território são as bases de uma política séria de Ambiente.

A Conservação é uma política nacional e global, não é sectorial, é transversal a todas as actividades que afectam o território, essas sim sectoriais : florestas, agricultura, estradas, energia, infra-estruturas - todos os sectores da economia devem ter, tanto mais neste século XXI ameaçado pelas alterações climáticas, uma componente conservacionista.

Um dos grandes disparates dum anterior Governo de pendor neoliberal, de resto  em concordância com obrigações e compromissos  ideológicos e financeiros, foi ter juntado os serviços florestais ao ICN – criando o ICNF.

O desaparecimento dos Serviços Florestais como entidade autónoma foi em erro tremendo -  no nosso País este serviço vinha do século XIX  e era um património cultural e institucional arreigado nas populações e que foi mantido através dos anos e dos regimes. Devemos ser um dos  raros países do Mundo, se é que há mais algum, que não tem  Serviços Florestais. Eu fui Administrador Florestal e sei bem o empenho e a obra notável que aquele Serviços faziam, e o papel indispensável dos Guardas Florestais. Muitos fogos florestais eram contidos à nascença porque havia sempre um posto de guarda florestal que avistava a primeira coluna de fumo, possibilitando o ataque ao incêndio na origem.

Hoje sob uma mentalidade liberal e sob a falsa alegação de maior eficiência, prefere-se combater os fogos do que preveni-los, dando milhões a ganhar aos privados, em vez de prevenir o seu aparecimento. Não temos guardas florestais dependentes do seu Serviço próprio, como sucede em todo o mundo. Os guardas florestais não são apenas polícias para terem sido integrados na GNR, eles são verdadeiros guardiões do território, orientados pelos técnicos florestais  e não pêlos oficiais e sargentos da Protecção Civil e da GNR; eles obrigavam os proprietários a limpar as matas, vigiavam os cortes ilegais, e em termos de economia não se vê diferença entre pagar os honorários a guardas integrados na GNR ou pagar-lhes o mesmo estando onde deviam estar que são os Serviços Florestais. Ou comparar os encargos com os Serviços Florestais com os milhares de milhões que hoje se gastam em  práticas sucedâneas que a prática demonstra não resolverem nada.

        O que interessou a quem teve essa ideia foi facilitar a vida aos proprietários florestais, à custa do abandono da vigilância quotidiana, e foi garantir e ampliar a actividade privada dos meios aéreos de combate aos incêndios. Negócio de milhões.

      Por isso, reconstituir de novo os Serviços Florestais é uma obrigação moral de quem vier fazer política séria e não comprometida com os interesses instalados. Enquanto eu tiver um sopro de ânimo, não me calo !

 Aliás não me canso de denunciar que o Estado, para "ser melhor Estado", acabou com tres classes de trabalhadores que eram indispensáveis à organização do território : os guardas florestais, os guarda rios e os cantoneiros das estradas. Com o combate aos fogos rurais entregue a uma Protecção Civil (nunca se vêem engenheiros silvicultores ou florestais nessas ocasiões, não são precisos...) , a limpeza das ribeiras  deixada aos abandono, as bermas e taludes das estradas entregues a umas empresas privadas que de vez em quando limpam tudo - é mesmo assim  limpam tudo! - o Pais ficou muito mais bem servido...

Mas tão mau ou pior ainda foi a descaracterização do ICN com a junção dos serviços florestais. Não há razão nenhuma que o justifique. Dizer, como já ouvi, que as Áreas Protegidas dizem respeito prioritariamente às florestas ( com mais precisão, o que nós temos são matas, não são florestas) é um treta : existem APs dos estuários dos rios, dos paúis, das dunas, das Berlengas, etc, que nada têm a ver com florestas; e os Parques Naturais como a Serra da Estrela, Montesinho, Serra d'Aires e Candeeiros, Baixo Guadiana, Ria Formosa, etc, têm a ver com a paisagem humanizada onde entram as matas, é claro, mas não especificamente com elas - têm a ver com o ordenamento do mosaico da paisagem, as pastagens, os campos de cultura, as aldeias, os monumento naturais e culturais, etc.

Foi comigo que foi criada a maior parte dos Parques Naturais e das Reservas deste País e desminto categoricamente que as matas fossem o principal motivo de classificação do território a proteger. As matas estavam, como deviam estar,  a cargo dos Serviços Florestais, que têm ainda a função de produção que não pode caber nas competências dum Serviço de Conservação da Natureza. É misturar alhos com bugalhos. Os Serviços Florestais, repete-se, devem ser autónomos e estar no Ministério da Agricultura pois a gestão do território não urbano passa pelo reconhecimento da ordem secular do ager-saltus-silva  e não precisam de inventar nomes, designem-no como em todo o mundo, por Serviços Florestais.

     Juntar os dois serviços serviu não só  para retirar estatuto aos florestais  mas também para  reduzir a margem de manobra que a política de Conservação do ICN devia prosseguir transversalmente sobre toda a actividade com impacte no território. Um ICN forte, conduzido por técnicos empenhados e convictos e não apenas à procura de currículo, é fundamental para a “sanidade” da Administração Pública portuguesa – e isso incomoda os interesses especulativos que governam, afinal, este País.

 Quer a nível nacional quer sobretudo a nível regional e local, a confusão actual nas estruturas do ICNF é completa, tornando quase impossível a administração correcta dos dois serviços num só, como está à vista de todos.

A situação das APs é deplorável, ainda há bem poucos tempo uma conhecida personalidade  com destaque e responsabilidades no domínio do Ambiente, me dizia quanto lhe custa ver a situação actual das APs, que já foram exemplares em termos europeus. Devemos ser o único país do mundo onde parques naturais como a Serra da Estrela, Arrábida, Ria Formosa, etc, não têm um Director responsável.

Por isso o ICN devia acrescentar não o F mas um P, ICNP - de paisagem. Nós aderimos à Convenção Europeia da Paisagem, temos paisagens que são Património da Humanidade. Atirar com Planos de Renovação ou de Transformação da Paisagem até daria para rir se não fosse trágico.

É mais uma maneira de encobrir os lobbies que procuram todos os trechos de paisagem notável para especular, seja com eucaliptais, seja com regadios intensivos que depauperam a água e os solos ou com  as urbanizações maciças como se estivéssemos ainda nos anos 60 do século passado. No Algarve a Quinta da Ombria é o bom exemplo de um mastodonte de urbanização maciça e a destruição da várzea e da ribeira, tudo com o aval da APA que deve ficar orgulhosa  com esta aprovação a uns finlandeses que na terra deles certamente não obtinham autorização para fazer um erro paisagístico e ambiental desta dimensão. E esperara, mais de 20 anos pela aprovação...

Nós fomos sempre elogiados na Europa, quer desde a antiga CEE, da UE  quer da OCDE, pelo carácter pioneiro da nossa legislação e pelas nossas realizações em termos de controle do território.

A Política de Ordenamento do Território  só voltará a ser eficaz e a garantir a salvaguarda da integridade do nosso reduzido espaço comum, se for conduzida com base numa Política de Conservação independente, interveniente e capaz de resistir aos lobbies especulativos que se abatem sobre nós, agora abrandados pela crise, mas prontos a afiar as garras mal exista uma ”aberta”.

       Aqui ficam pois algumas considerações sobre matérias que deviam ser básicas numa política de esquerda democrática.

O PSD, nos seus tempos social democrata embora do centro direita ( hoje procuram esquecer que Sá Carneiro quis inscrever o PPD na Internacional Socialista…) foi um dos Partidos que maior contributo deu para a Politica de Ambiente). Hoje a esquerda democrática ou é ecologista ou não é esquerda – e a nossa esquerda representada pelo PS não é .

Para uma política  ambiental eficaz tem que ser dado incremento ao sector primário – agricultura e florestas – e ter uma organização do Estado e do Governo que o permita. Este disparate de um Governo com 50 membros ( 19 ou 29  são ministros…) é incompatível com uma governação eficiente e só revela, por um lado  a dificuldade que António Costa tem em convencer a entrar para o Governo um número mais reduzido de pessoas mais  competentes, por outro a necessidade de dar tachos a todos os amigos e amigos dos amigos mesmo que sejam incompetentes ou zeros “ à esquerda”- Cabrita, a da Agricultura, o morcão do Ambiente, e por aí fora.

Quem convictamente serve a defesa do Ambiente não abdica de transmitir as suas ideias, sejam elas aceites  e compreendidas ou não, porque sabemos que são indispensáveis a uma política de esquerda democrática; é com os PS e PSD europeus que se aliam os partidos verdes ( que nada têm a ver com o nosso partido “melancia”, verde por fora, vermelho por dentro). Por cá não temos um partido verde independente, mas temos gente capaz, sem estar partidariamente vinculada, para assumir as funções de uma Política de Conservação.

Assim houvesse ao menos vergonha pelo estado a que se chegou nestes domínios.

 

 

 

 


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