quarta-feira, 27 de novembro de 2019

As grandes  cheias de Lisboa em 1967
Durante a tarde e a noite de 25 para 26  de Novembro de 1967 choveu na região de Lisboa, em menos de 24 horas, um quinto da precipitação média anual e os resultados foram a maior catástrofe natural que aconteceu na capital depois do terramoto de 1755. O Governo de Salazar tentou encobrir a dimensão da tragédia, mas a pouco e pouco vieram ao de cima os números : mais de 700 pessoas morreram nos concelhos limítrofes da capital, vítimas do desordenamento do território. Eram as camadas mais pobres que não tinham posses para ter casa própria em sítios adequados, e que ocupavam  os terrenos públicos ou mais baratos da periferia, em condições deploráveis.
Eu nessa altura morava na Madeira mas vim a Lisboa e creio que foi a 27 desse mês que, um tanto embasbacado, vi na Televisão, no noticiário da noite, o Arq.ª Gonçalo Ribeiro Telles a explicar as razões do sucedido. Ora não havia memória do Ribeiro Telles ter tempo de antena, opositor como era do regime, e como recordava aqui há uns anos a Arqª Helena Roseta, ele veio  falar de assuntos que hoje são lugares comuns mas que na altura poucos - além dos arquitectos paisagistas -  conheciam : ocupação de leitos de cheia, impermeabilização e ocupação das cabeceiras das linhas de água, abandono dos solos agrícolas, etc. E apontava para a necessidade de se ordenar a paisagem, de corrigir as linhas de água e proceder à limpeza e reconstrução, em termos funcionais, das cabeceiras e dos leitos de cheia. Nessa altura eu trabalhava na delegação do Funchal da Direcção Geral de Urbanização, e ao vir a Lisboa em serviço aproveitei, visitei o Gonçalo como fazia sempre e dei uma volta com ele pela região afectada, não só na área  de Loures, como também  de Oeiras, Sintra, etc. Eram imagens dantescas de destruição dos cursos de água, das margens, o alagamento de terras férteis, os amontoados de destroços...
De novo em 1983 voltaram a acontecer cheias  colossais na região de Lisboa, já não tão trágicas como as de 67 mas ainda assim provocando uns 10 mortos, muitos feridos e muitos milhares de contos (contos em escudos...) de prejuízos.
Nessa altura fui eu nomeado pelo Secretário de Estado do Ambiente Engº Carlos Pimenta para Coordenador do Grupo de Trabalho para Estudo das Causas das Cheias, que reunia técnicos competentíssimos  do LNEC, da Hidráulica, do Serviço de Solos e outras Entidades relevantes.
Uma das primeiras acções que fiz foi ir visitar as áreas mais afectadas e lembro-me de ter ficado  surpreendido porque os piores desastres sucederam nos mesmos locais que já haviam sido destruídos em 1967 - quer dizer que não se tinha aprendido nada, tinham sido reocupados muitos dos locais que as cheias haviam atingido anteriormente.
Cá fica para memória futura até porque não sei se hoje já se terá realmente aprendido alguma coisa ...







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