Dia de reflexão
Hoje, sábado 29 de Janeiro do ano da graça ( veremos se tem graça...) de 2022, é o dia de reflexão para as eleições de amanhã. Então vamos reflectir uns minutos.
Ganha o PS ou o PSD? Grande suspense, mas esses dois já era espectável que fossem os mais votados, só que a margem estreita que os separa devia servir de exemplo e de ensinamento pelo menos para António Costa.
De Rui Rui não era de esperar grande nível nem grande clareza nas propostas, quanto a Costa. considerado um político com grande faro, deve ter-lhe subido à cabeça ser Primeiro Ministro durante 6 anos. A sua arrogância em nunca dar o braço a torcer mesmo quando nos seus governos se davam grandes broncas e exemplos lamentáveis de incapacidade política, atestam pouco respeito pela ética democrática e republicana. Mas se fosse só por ele, era pena mas passava, o pior é que se propagou aos outros comparsas e alguns desses aliando a tal arrogância a uma total falta de capacidade política e de empatia, nitidamente prontos para repetirem a " voz do dono".
Apetecia-me enviar uma carta mais ou menos nestes termos...
"Exº Senhor Primeiro Ministro
Sempre fui da esquerda democrática mas cultivando a independência de pensamento que é apanágio da liberdade democrática, livre mas responsável - por isso encarei com satisfação a sua governação à esquerda, não por estar de acordo com todos os princípios basilares das ideologias radicais que os seus parceiros encarnam, mas para tirar proveito de algumas exigências de carácter social sem o que PS não poria em execução algumas das propostas que tanta gente que trabalha e é tão mal paga, tem direito. Também não desculpo inteiramente esses parceiros que, tal como em 2011, se aliaram á direita e, em vez da austeridade do Pack IV, tivemos a austeridade absurda da Troika neoliberal - e agora arrastaram-nos para este imbróglio. Mesmo assim gostaria que da sua parte tivesse havido alguma insistência no diálogo - só que estava convencido de que teria a maioria absoluta, que agora já não invoca, mas que o cegou durante os últimos meses, para mal dos nossos pecados.
O Sr. Dr. António Costa vai possivelmente ser de novo o próximo Primeiro Ministro. Espero - e acredite que muita gente também espera- que um novo Governo seja bem diferente deste que chegou ao fim, não só no número anormalmente excessivo de membros mas igualmente na sua qualificação. Percebe-se que não seja fácil encontrar pessoas com elevada qualidade profissional e personalidade que aceitem ser Ministros principalmente para obedecerem à tal voz do dono; só quem anda atrás dum tacho ministerial é que aceita essa condição. O que se passou sobretudo nestes últimos dois anos foi intolerável e deixou aqueles que o queriam defender ficar sem palavras para o fazer. E a pandemia que serve para desculpar muita coisa -. e eu sou dos que entendem que nesse capítulo era difícil fazer melhor e só a baixa politiquice é que pode acusar os zig-zags do processo, zig zags que se verificaram em todo o mundo - mas não desculpa os erros dos seus ministros, erros crassos.
Mas não ter tido a coragem de emendar certas políticas e substituir alguns governantes que passaram das marcas da incompetência ou da asneira - nem parece de quem, como o Sr. PM, tem tanto faro político. Não teria sido prova de fraqueza antes de vontade e de bom senso político. Tal como foi tratou-se de mero clientelismo de que o PS tem dado fartas provas.
Importa-me abordar aqui o sector primário que certamente não o levará a concordar com aquilo que defendo - e acredite muito mais gente e mais qualificada que eu também defende ( excepto os liberalistas, neoliberais ou libertinos). É o sector para o médio e longo prazo essencial para Portugal e ...tem falhado redondamente.
Desde o direito romano que a organização do espaço rústico se faz com ager-saltus-silva. Daí que ter separado a agricultura das florestas foi continuar a desinformação que já vinha da direita e é um absurdo que apenas transmite a ideia de desconhecimento dessas matérias e, pior, vai favorecer os grandes grupos económicos em detrimento dos pequenos e médios agricultores e é uma alavanca para a indústria da celulose em detrimento de uma política florestal equilibrada. E ter havido quem quisesse ser ministro nestas condições só pode significar que não entende nada do assunto ou, pior. que aceita qualquer tacho ministerial seja lá qual for. Que a agricultura e a silvicultura ( não temos florestas, temos matas) devem ser geridas em comum é uma das verdades a la Palice.
A sustentabilidade assenta em tres elos - gente, solo e água.
Gente? O interior desertifica-se desde que Cavaco Silva deu um dinheirito europeu para que os pequenos e médios agricultores deixassem de produzir. porque da UE viria toda a comida que fosse precisa. E para completar a obra extinguiu os Serviços de Extensão Rural que eram essenciais para apoiar as pequenas e médias explorações - mas nunca mais nenhum governo, incluindo os do PS, reconstituiu esses serviços, Porque afinal todos se orientam pelos mesmos princípios de liberalismo económico, a quem interessa apenas os grandes grupos de produção intensiva - erro fatal para um país como o nosso.
Solo? temos milhares de hectares de solo agricultável ao abandono e não há incentivos para voltar a produzir culturas alimentares de que importamos a quase totalidade do que consumimos. Mas o Ministério da Agricultura apoia a agricultura intensiva com milhões de euros, até algumas culturas regadas como as de abacate no Algarve, que se vem adicionar às outras tradicionais na região como os citrinos. Em vez de reocupar os solos abandonados com culturas alimentares, mesmo regadas - sempre ficava alguma coisa, assim os produtores exportam, metem o dinheiro ao bolso e o solo e a água que gastaram ficam a faltar para o futuro. Ninguém quer acreditar que estamos a caminhar para um regime agressivo de secas prolongadas e ninguém assume a nossa condição mediterrânica.
Houve um socialista de "primeira água", o Prof. Manuel Gomes Guerreiro, que escreveu um livrinho hoje esquecido intitulado "A floresta na conservação do solo e da água!" que deveria voltar a ser lido por muitos técnicos e pelos políticos que decidem sobre estes assuntos.
Sem uma silvicultura racional e adaptada ao nosso território, nunca teremos armazenamento capaz da pouca água - cada vez menos água - que nos vai caindo do céu.
Portanto sem gente no campo que quer dizer no interior, sem solos bem cuidados e sem água, a sustentabilidades do nosso espaço nacional fica cada vez mais comprometido - acredite ou não, Senhor PM. este é o rumo em que estamos metidos e que só com uma governação inteligente e responsável poderíamos ir gerindo razoavelmente.
Depois vem o Ambiente - de certeza que chegaram ao seu Gabinete, ao longo dos meses, as críticas feitas ao titular escolhido que uma das primeiras declarações sonantes que fez ao Expresso foi de que não era ambientalista . Então como e porquê foi escolhido para essa pasta ? Se era para lhe dar um tacho desse outro em que o cavalheiro soubesse o que estava a fazer; ou ao PS e ao Senhor PM o Ambiente vale assim tão pouco?"
E a carta prosseguiria com o rol de asneiras e erros crassos que foram cometidos no sector primário. Mas fico por aqui.
A questão que se coloca no fim é então : e se for o Rui Rio a ocupar o lugar de PM? Quer dizer que estamos lixados, com a IL e o Chega a darem ordens, por mais que digam que a este ultimo não o querem, Cá estaremos para assistir a este triste evoluir da nossa democracia que, apesar de tudo, se aguenta, e a campanha eleitoral, com todos os seus excessos e disparates ( próprios do baixo nível de muitos dos intervenientes) ainda assim se manteve em patamar aceitável de discussão. Viva a democracia.