segunda-feira, 27 de setembro de 2021

 A democracia é o pior dos sistemas...

...à excepção de todos os outros, a celebrada frase de Churchill, voltou a revelar-se nestas eleições para as Autarquias.

António Costa, reconhecido como um grande político até aos ossos, tem como pior defeito não aprender com os erros e não emendar a mão, o que significa arrogância. E esta arrogância até já eu, um simples observador, denunciei por mais que uma vez - o mal que essas atitudes fazem a um governo que se diz  de esquerda democrática, que deveria ser exemplar  e que atira as pessoas para outras bandas do espectro político. 

Com medo de perder credibilidade na Europa, Costa deixou de fazer uma política de esquerda, com prioridade ao social e ao público, e só o apoio indispensável dos Partidos da esquerda o tem forçado a tomar medidas mais ousadas nesses quadrantes. 

 Claro que fez uma campanha eleitoral péssima, arrogante, sempre a abanar com a montanha de dinheiro que aí vem e que ele pode distribuir; podem dizer que sempre foi assim, com o PSD nos governos era a mesma coisa na altura das eleições - mas o errado feito pelos outros não justifica que se volte a repetir, até porque  depois da pandemia ele tinha uma confortável vantagem na opinião pública e as pessoas parecem estarem mais despertas para as falsas promessas . Errou e não parece virado para corrigir.

Por teimosia e arrogância não teve coragem nem vontade para  demitir ministros que estavam a mais - o Cabrita, bombo da festa,  é o melhor exemplo. Depois da morte do ucraniano pelo SEF, no aeroporto, depois de palhaçadas entre a GNR e a PSP, ia num carro a 200 km/hora, matou um trabalhador e nada lhe acontece.- É precisa desfaçatez, lá por ser amigo seria melhor amigo se o tivesse mandado para casa para ficar menos sob a luz dos holofotes. E podiam citar-se outros Ministros incompetentes, como os do Ambiente, da Agricultura ( será que existe mesmo?), da Ciência, que uma remodelação oportuna teria dado do Governo outra imagem mais positiva  - e do próprio Costa também.

Desta eleições ficou patente  que só mesmo os ferrenhos ps votaram pelo Partido; e ainda bem que o PSD subiu alguma coisa, na democracia que eu defendo a esquerda e a direita democráticas são fundamentais. E tal como estava o PSD era uma rampa de lançamento mais fácil para a IL e o marafado do Chega. Felizmente estes, embora com alguns êxitos locais, ficaram abaixo do que esperavam, embora digam o contrário, pois tirando o PCP ninguém admite que perde...
Vai grande euforia nas hostes pela vitória do Moedas em Lisboa, mas é uma vitória de Pirro... Teve mais uns votos que Medina por isso assume a Presidência, mas tem o mesmo número de vereadores, não sendo plausível que tanto o BE como o PCP colaborem com o PSD ( nunca se sabe, é verdade...). Portanto se a presidência fosse assumida pelo PS teria o apoio compreensível dos outros dois - assim que irá fazer ? Pedinchar ao PS que aprove tudo quanto quiser fazer aprovar? Já se viu coisa mais vexatória? Mas pessoalmente foi bom para Moedas e muito bom para Rui Rio.

A IL e o Chega elegeram qualquer coisa, para novatos é melhor que nada, mas  estou em crer que se o PSD e o CDS se  aguentarem os níveis dos dois pequenos Partidos se manterão baixos. Veremos se me engano dentro de alguns meses com o andar da carruagem.

Mas que o Chega tem algum campo de manobra no Algarve, lá isso tem - dois vereadores, um em Portimão e outro em Loulé - este para moer a paciência ao Victor Aleixo...





sábado, 25 de setembro de 2021

 Pequenas homenagens que são injustiças

No dia 7 de Setembro, Dia da Cidade em Faro, a Câmara Municipal quis homenagear duas personalidades atribuindo os seus nomes a dois arruamentos...do Parque Ribeirinho.

Começa porque o parque além de ser de pequenas dimensões para o pomposo nome de Parque, está mal cuidado e é gerido certamente por "especialistas". As palmeiras-anãs foram desbastadas e parecem pincéis de barba, os arbustos ( tamargueiras, salgadeiras) estão podados em bolas ou em cubos - forma "moderna" até ao século XIX de fazer jardins à francesa e também arrear as árvores de ruas e estradas fazendo delas outros abortos; mas passam as décadas e  ninguém consegue que as Câmara Municipais acabem com essa prática arboricida.

Então ao caminho principal do Parque atribuíram o nome do Fernando da Silva Grade, velho Amigo precocemente falecido, lutador incansável a favor da defesa do património cultural e natural - quando o mínimo decente teria sido dar o nome dele ao parque. Mas o desplante foi ainda ultrapassado quando atribuíram a outro caminho do mesmo parque o nome de ...Gonçalo Ribeiro Telles!!

No dia seguinte enviei ao Presidente da Câmara uma carta que se transcreve a seguir, para memória futura.

"Ex.º Sr. Presidente da Câmara Municipal de Faro

Dr. Rogério Bacalhau Coelho

Ontem dia 7 de Setembro, no âmbito das comemorações do Dia da Cidade, foram prestadas  homenagens, algumas das quais tem a ver comigo e com os sentimentos que me inspiraram, por isso não ficaria bem com a minha consciência se não viesse expressar a V.ª Ex.ª o que penso, sem que isso diminua, antes aumente, o meu respeito pelo Poder Local em liberdade. 

Foi descerrada uma placa com o nome de Fenando da Silva Grade no passeio principal do Parque Ribeirinho, ele que foi um ilustre cidadão, independente e activista pela defesa do património natural e cultural algarvio, particularmente farense, e de quem fui grande e afeiçoado amigo. Foi muito pouco - o Parque já de si é de modestas dimensões e está mal cuidado, mesmo assim o que seria devido ao Fernando é que dessem o nome dele ao parque, não a um simples arruamento.

Mas o pior ainda estava para vir e chocou-me - e não só a mim mas a muitas pessoas que compareceram - que quem decidiu das homenagens tivesse tido o desplante ( desculpe-me falar assim) de atribuir a um outro caminho do Parque o nome de. Gonçalo Ribeiro Telles. Como é possível ter-se tão pouca noção da proporcionalidade dos actos ?

Eu recusei-me a assistir ( e não só eu) a essa menorização de uma figura de projecção nacional e internacional como Gonçalo Ribeiro Telles, cujo nome não se atribui, como que por sorteio, a uma ruela dum pequeno parque ribeirinho - nem em Lisboa nem em povoação alguma!! Brada aos céus, Sr. Presidente.

Faço parte de uma Comissão que, com a APAP (Associação Portuguesa dos Arquitectos Paisagistas) preparam a comemoração do centenário de Ribeiro Telles e estamos todos cientes de que irá acontecer o aproveitamento do nome daquele ilustre português sempre que der jeito seja a quem for - e denunciaremos sempre esses casos, como agora.

Darei conta desta minha carta àquelas duas Entidades que acima referi.

Como creio que o Sr. Presidente me conhece bem e à minha maneira de ser, o que escrevi acima não invalida que lhe envie a minha consideração e os melhores cumprimentos.

( Permita-me que lhe envie o meu último livro saído em Junho passado)







sexta-feira, 24 de setembro de 2021

 Acaba a campanha eleitoral

Acaba hoje a campanha eleitoral e ouve-se dizer tudo e o seu contrário, para alem de podermos aceitar que em  alguns casos se andou pelo ridículo, pelo excesso de linguagem, até pelos disparates inéditos.

Certo, sim senhor, mas quem é democrata e quer viver em democracia, aceita as condições dessa procura. Fartos da campanha ? Então queriam o quê, que não houvesse campanha ?  Que o Partido único, fosse fascista ou comunista ( os extremos tocam-se, doa a quem doer) dissesse -  tu vais ser Presidente da Câmara. tu vais ser Regedor da Freguesia ( lembram-se ainda dos Regedores de Freguesia?), tu ficas em vereador para controlares o resto  ? Por muito chatas que as campanhas sejam, o que sobretudo me  incomoda são as falsidades, a linguagem de cartilha, as promessa que se sabe de antemão que não passam disso mesmo, e os dislates e verborreia excessivos. Mesmo assim eu continuo a preferir estes incómodos ao sistema anterior.

Ora aborrece-me  que António Costa abuse do papel de Primeiro Ministro - todos os anteriores fizeram o mesmo em  circunstâncias semelhantes, a gente sabe - mas como democrata dum socialismo democrático ( a renascer na Alemanha e um pouco pela Europa fora) eu sou mais exigente e custa-me assistir aos autênticos tiros no pé que ele dá, sem necessidade. A arrogância raia o abuso de poder e isso é o pior que se pode dizer de um governo de esquerda democrática.

Mas não deixa de ser curioso ver as linguagens de cartilha. O patrão da  IL diz que nunca se associaria à coligação de direita  em Lisboa porque muitos dos que estão nesta coligação não partilham do mesmo ideal liberal ( eu diria libertino...) da IL Boa !!

O Carlos Moedas, que até tinha deixado presa a ele uma ideia de um técnico moderado e competente enquanto esteve na Europa, ao querer fazer de político caseiro mostrou um nível bem medíocre.

O Chega, tenho a impressão, vai ser um flop; a pobreza de muitos dos candidatos ( sem ser preciso descer ao ridículo do candidato em São Brás de Alportel) creio que não convenceu tanta gente como se temia - veremos. Em termos de futuro temo mais a IL e a sua arrogância classista urbana do que o populismo medíocre do Ventura e de alguns títeres que tem ao seu lado.

E as palavras de encerramento de Jerónimo de Sousa no comício do PCP têm uma nostalgia "démodée": vemos a CDU a crescer em todo o País, o povo trabalhador sabe que pode confiar na CDU, e acabar com um grito de alma : Viva Lisboa, Viva Portugal, Viva a CDU ! - a CDU sempre á frente  de Lisboa e de Portugal...





sábado, 18 de setembro de 2021

  Reflectindo sobre os dias de hoje...

Há um facto que me parece cada  vez mais evidente : a pandemia teve consequências à primeira vista pouco evidentes sobre o comportamento de uma boa parte das pessoas -infectadas ou não - mas a pouco e pouco essas consequências tornam-se indiscutíveis. 

E afectou pessoas de todos os estratos sociais e de todas as capacidades intelectuais - se calhar até mais dessas do que daquelas que pouco mais tem ou tinham que preocupações do dia-a-dia.  Aqui e em todo o mundo.

Pior, acirrou comportamentos explosivos e que são de difícil entendimento entre pessoas responsáveis  que aparentemente faziam a sua vida normal mas, no seu íntimo, seriam já psicologicamente e intimamente mais inseguras - e que agora se revelam nas suas fraquezas.

Não sou especialista em nada das matérias científicas que envolvem a virologia e a sua transposição para a pandemia mundial, mas passados todos estes meses damos connosco a pensar em coisas que ocorrem e  que em tempos "normais" ( porque o tempo da pandemia não é normal) não ocorriam ou não atingiriam a dimensão que configuram hoje.

Começou com o ataque dos "trumpistas" ao  Capitólio e as ameaças aos políticos em funções naquela que se diz ser a maior democracia do mundo; toda aquela agitação e a enormidade dos disparates e aleivosias envolvendo milhões - milhões! - de americanos, juntamente com a sua oposição a reconhecerem a pandemia e a necessidade do seu combate, não configuram um comportamento normal de uma sociedade medianamente informada - mesmo os norte americanos não sendo propriamente um modelo de cultura generalizada da população... Mas, até se ter espalhado a pandemia e os seus medos e mistérios,  não se verificavam  os comportamentos "anormais" que passaram a evidenciar-se com tanta difusão.

E há um elemento crucial por trás de tudo isto : as redes sociais e a dimensão que dão a posições e argumentos perigosos para a democracia e para a Humanidade, pior ainda em nome da liberdade de expressão. 

O mal está nas redes sociais? Para mim está, porque podendo elas serem na sua génese uma forma excepcionalmente popular e mundial da liberdade de expressão, a maneira como são desreguladas e o acesso impune que dão a tudo quanto sejam falsidades, insultos, difamação,  soluções decisivamente más ( do espírito do mal ), permitem a difusão desse mal.

O fenómeno do negacionismo, com a dimensão que adquire hoje em dia, vive a meu ver de duas causas :  o transtorno psicológico que afecta pessoas de todas  as formações intelectuais mais do que a gente pouco instruída, e as redes sociais com o regime ou a falta de regime com que hoje funcionam.

Era um fenómeno que também teria de chegar cá, e chegou. As manifestações dos "negacionistas à portuguesa" já nos revelaram dois figurantes exemplares :  aquele juiz perfeitamente tresloucado que perdeu o controle dos seus actos e apela ás suas capacidades intelectuais, que tem, para delas fazer gaudio, sendo pessoa que praticamente ninguém conhecia fora do seu círculo restrito de relações -. talvez quem o conheça melhor encontre o fio da meada  dos antecedentes que  o trouxe até aqui; e o pateta do Fernando Nobre que,  a par de ter constituído uma obra de assistência médica e social de grande mérito, revelou há vários anos alguns aspectos de fragilidade psicológica que não seria de esperar num médico com o prestígio que adquiriu. Aquela vaidade que o levou a aceitar que o propusessem para Presidente da Republica, naquelas condições, e depois a aceitação da falsidade que, como deputado, seria logo indigitado ( não seria eleito, seria indigitado,,,) Presidente da Assembleia da Republica,  torna hoje mais notória uma grave  falha de carácter ou de discernimento -  isso talvez agora explique  como é que um médico ignora o que é a acção de um vírus, ignora o que a sua Medicina lhe ensinou e que ele tinha por obrigação de respeitar.

O perigo para a democracia existe e é claro : a confusão entre o direito â liberdade de expressão e as totais impunidade e  irresponsabilidade criminal que resultam do uso de propostas e notícias criminosas nas redes sociais que ninguém controla - a não ser os próprios donos das redes sociais que às vezes assumem  eles o papel de fechar o acesso temporário a essas redes, como aconteceu com o Trump, Quer dizer esses sujeitos donos das redes sociais é que são quem  controla a liberdade de expressão, não são os cidadãos nem os seus Governos legítimos. i

Isto é muito sério.





sexta-feira, 17 de setembro de 2021

 Pequenas histórias

A minha vida já vai longa, o que dá como resultado que já tenha algumas histórias para contar. Estas notas que incluo no blogue são essencialmente para mim, embora saiba que tenho alguns amigos que as lêem. Hei-de ir contando algumas dessas histórias.

Há dias numa Clínica em Coimbra um médico falou a outro médico meu amigo, que o seu pai já tinha 103 anos, estava excelente e ainda conduzia o carro; um colega em em Lisboa mostrou a fotografia da mãe que, com 106 anos, está com muita saúde - cá estão dois objectivos que bem posso tentar alcançar...

Começo por uma história engraçada :  há dias telefonou-me um amigo, biólogo, António Araújo, conhecido como Kaiser, e que aos 60 e tal anos vem fazer o doutoramento na Univ. do Algarve. É talvez a pessoa que eu mais influenciei na vida, felizmente com o maior sucesso, porque se tivesse corrido mal pesar-me-ia na consciência.   Aí nos anos 90 do século passado fui encarregado de criar o Parque Natural da Cufada, na Guiné, e tive de constituir uma equipa; da botânica encarregava-me eu, com recurso a alguns especialistas, da fauna em geral tive um bom zoólogo que tinha vindo de Angola, o Dr. Crawford Cabral, e precisava de um especialista em avifauna. Ora havia no Serviço o CEMPA ( que já se chamara CEMA, outra história...) onde trabalhavam tres rapazes, o Rui Rufino, o Francisco Ribeiro Telles e o Kaiser e este pareceu-me pelo seu feitio e vivacidade o mais indicado - convidei-o e ele aceitou. Nunca mais saiu de África, passou para a UICN e fez toda a sua brilhante carreira  naquela região. 

Em dada altura vivia num país dos mais improváveis para se viver, a Mauritânia, e eu acedi à sugestão para o visitar. Com a minha mulher estávamos no Senegal e fizemos a viagem de taxi de Dakar até ao rio Senegal que faz a fronteira com a Mauritânia, uma viagem muito boa passando pelo Lac Rose, sempre pela savana e deserto  e parando lá ao norte na cidade de San Louis, antiga capital da África Ocidental francesa, hospedados num "résort" de pequenas cubatas que em época áurea deve ter sido agradável. Fica na foz do rio, tem a praça central que parece um quarteirão da baixa parisiense com prédios do Império, mas o resto é um amontoado de casas e maus cheiros difíceis de suportar. Como é um porto de pesca e amanham ali o peixe, o fedor a peixe podre e as moscas são um pequeno inferno.

No outro dia atravessámos o rio num ferry-boat e toda a gente conhecia o António, que nos esperava do outro lado e nos conduziu até Nouakchott, a capital da Mauritânia.

Vem a seguir um pequena história. Metemo-nos num jeep, o António e a companheira à frente, eu e a Conceição atrás,  em direcção ao norte e sempre próximo do mar; no deserto não havia  estradas, apenas trilhos visíveis dos veículos que por ali cruzavam e foi o meu primeiro contacto com o Sahara que ficou para sempre um dos meus ambientes mais admirados  do Mundo! Parámos num local da costa em que estavam a descarregar peixe e levámos um grande carapau porque dizia o António que lá ao norte, quando acampássemos, iriamos usar como isco para a pesca. O carapau foi colocado ao lado das malas no tejadilho do jeep.

Nunca mais nos lembrámos do peixe; isto foi em Junho de 2004, enquanto decorria o campeonato de futebol. Acampámos na praia, sob um grande promontório,  e lá em cima  funcionava uma estação de comunicações e radar; nesse fim de tarde fomos lá  falar com o pessoal de serviço e o oficial garantiu-nos que nessa noite, em que Portugal jogava com a Inglaterra, se nós ganhássemos ele iria à nossa tenda dar a notícia. Não apareceu, na manhã seguinte fomos despedir-nos e o homem então disse que  Portugal tinha ganho mas ele tinha tido tanto serviço que não deu tempo a ir avisar-nos!...

Seguimos viagem para norte, quase até ao Cabo Branco, passando ao largo de uma laguna que, coisa interessante, era o limite sul  das pradarias de Zostera. cujo limite norte é na Ria Formosa.

Por fim voltámos para baixo em direcção ao sul, pelos trilhos onde passáramos uns dias antes e  demos boleia a um mulah, uma espécie de padre, que ia para a capital; eu tive que passar para o meio no assento porque o padre, sempre a rezar o seu rosário,  não se sentava ao lado de uma mulher e infiel... Em dada altura o António disse que iriamos ver um concheiro pré-histórico e virou o carro para o interior- o padre em mau francês,  fartou-se de berrar que íamos para o sul não para ali e só quando parámos e vimos a enorme colina de artefactos pré-históricos é que percebeu e sorriu.

Retomada a direcção ao sul, em dada altura o António travou bruscamente o carro e apontou, entre gargalhadas, o carapau, de que nunca mais nos lembrámos, que caíra do tejadilho e ali estava há vários dias seco "que nem um carapau". Eu tentei dizer ao mulah que o carapau caíra de cima mas ele não percebia e gritava, "non,pas du ciel,  il vient de la mer". Foi uma risada que ainda hoje ressoa!!

O homem estava confuso, e mal parámos num acampamento para descansar ele - que ia para a capital como nós - despediu-se logo ali e já não quis seguir connosco.

Esta viagem pelo Sahara ocidental  vendo as imensas dunas a chegarem exactamente até à  praia, os camelos a pastar  a magra ervagem, o imenso horizonte ondulado, marcou-me para sempre.








sexta-feira, 10 de setembro de 2021

 Jorge Sampaio

Faleceu Jorge Sampaio, que eu recordo como o rapazola ruivo e magricela, um dos líderes - a par de José Medeiros Ferreira - das greves académicas de 1962, em que também andei envolvido. Eu fazia parte da direcção da Associação Académica do ISA, presidida pelo Melinho ( Álvaro Soares de Melo) e era o vogal para os assuntos culturais.  As reuniões da RIA ( Reunião Inter Associações) que estava proibida, continuaram sempre a realizar-se de formas  inventivas como nas bancadas do Estádio Universitário enquanto no relvado o pessoal "da pesada" jogava ragby.

Recordar Jorge Sampaio faz passar pela minha memória todo esse tempo tão importante da minha vida.

 O percurso político de Jorge Sampaio veio confirmar as suas qualidades de integridade, sentido da dignidade no serviço público e forte base cultural e técnica como jurista; ter despachado para fora do Governo o menino birrento Santana Lopes que não tinha jeito nenhum para o lugar que ocupava, reforça essa ideia que ele deixa de si mesmo.

Aqui fica esta nota recordatória  e é bom para mim enquanto sou eu a deixar lembranças dos que vão partindo...




segunda-feira, 6 de setembro de 2021

 Assim vamos nós e o mundo

O desastre do Afeganistão e o resto

O sucesso dos taliban no Afeganistão é mais um sinal, e dramático,l da perigosidade em que se está de novo a tornar o islão radical. 

A sujeira dos EUA ao fugirem á pressa, sim, a fugirem de Cabul, é um  triste retrato do comportamento de como os ocidentais e em especial os americanos, se comportam hoje perante o resto dos outros povos, e com a desculpa - pois não passa de desculpa - de que em democracia somos condescendentes e respeitadores dos hábitos culturais do outros. Outros a quem explorámos enquanto pudemos, é bom recordar, que governámos como protectorados facilitando a vida aos magnatas e deixando a esmagadora maioria dos povos na miséria : foi assim que o Imperio Britânico dividiu as etnias  e inventou países novos  para melhor os explorar; já em pleno século XX em que já se tinha  plena consciência histórica  de que isso era errado; franceses e britânicos ocuparam e tentaram derrotar os vietnamitas, os coreanos, os birmaneses, os indianos; todos os povos árabes formam "protectorados" e só conseguiram a independência quando os europeus já não podiam  segurar um gato pelo rabo... 

Salazar em pleno século XX inventou um novo nome para as colónias e manteve os territórios africanos sob colonialismo serôdio que nos devia envergonhar - mas em vez disso continua a haver quem elogie o "heroísmo" de sermos o derradeiro país colonialista. 

A Pérsia, que passou a ser Irão,  domínio dos xiitas que sempre se opuseram aos sunitas, na esmagadora maioria árabes e otomanos, foi recortada pelos britânicos, retirando-lhes a sua cidade santa, Kerbala, a "Jerusalém dos cristãos"  colocada no inventado Iraque, que ficou  com 60% de  de xiitas, 20% de sunitas e quase 20% de cristãos e outras religiões (drusos, etc) - governada por um rei também inventado, Abdala, que era sobrinho do Governador de Jerusalém. Tudo compadrio e clientelismos.

O último Xa, Reza Palevi, foi um gatuno para os cofres do país, vendeu o petróleo escandalosamente aos americanos e ingleses para aguentar o Estado, impôs regras ocidentais - de um dia para o outro as mulheres que andavam cobertas pelo véu passaram a andar de  mini saia e decotes à americana, sem respeito pelas longas tradições do povo e dando lugar aos extremistas que depois  tomaram o Poder - duas famílias persas poderosas e rivais, os Palevi e o Khomeini.

Eu estive em Persépolis nas ruínas daquilo que foi um aldeamento de grande luxo que o Xa mandou construir para receber milhares de convidados  de todo o mundo,  só para festejar os 2.500 anos do Império Persa, e que deixou as finanças públicas na rotura -  um escândalo que o povo não perdoou.

Estas asneiras, sobretudo as  perpetradas ao longo  dos últimos dois séculos, explicam  a situação catastrófica em termos civilizacionais, que hoje estamos a enfrentar - apenas  começamos a enfrentar.   A cegueira e mesmo estupidez com que os países ocidentais se tem comportado não tem explicação nem desculpa. Os americanos são essencialmente ignorantes e embora possuam uma elite super educada e super instruída, científica e tecnologicamente superior, uma boa parte da população é medíocre e até parece que faz gala nisso. Só como exemplo, devia ser impensável que alguns milhões de americanos sejam criacionistas e tivessem escolhido entre estes   uma candidata a Vice Presidente, vinda do Alasca !!

O que os americanos fizeram no Iraque, já falei nisso anteriormente,  basta para vermos como a ignorância e a jactância dos dólares pode levar a tanto disparate com consequências trágicas.

Estar 20 anos no Afeganistão, com uma chegada que se pode justificar para punir o terrorismo que dali saiu e podia servir de exemplo para futuro, era uma coisa -  mas não ter percebido que o fenómeno dos talibans não se resolvia impingindo a democracia como quem vende armamento ou electrodomésticos, é outra coisa. E os europeus que se mantiveram lá são ainda mais responsáveis, porque tinham obrigação estrita de ensinar aos americanos um caminho diferente, em vez de terem sido coniventes e colaboradores de 20 anos de asneira grossa. Também quer dizer da queda do prestígio europeu, há décadas sem dirigentes com a categoria que a velha Europa exigiria.

Em vez de impingir democracia "burguesa" ocidental que levou muitos anos a ser contruída, com muitos sacrifícios, com séculos de resistência ao poder papal,  à Inquisição e aos fantasmas do feudalismo, o Ocidente tem que defender essa democracia, particularmente quando está a ser objecto de milhares de emigrantes de todas as etnias e religiões, e a principal regra que deve ser ensinada - e imposta -  a todos os que vem viver nos países europeus é a da reciprocidade. Tanto se me dá que isto seja considerado facciosismo por esquerdistas, mas a reciprocidade de tratamento é a base da convivência entre humanos que deixaram o Paleolítico há muitos milhares de anos. 

 O Islão tem as suas regras, da Sharia, das quais não abdica  mas os países não muçulmanos  devem  exigir que, quando vão visitar ou se instalam nos países muçulmanos, vejam respeitados os seus hábitos e posturas em sociedade, o que não acontece. E quando muçulmanos, ou hindus, ou  de qualquer outro credo, vem para o Ocidente tem que respeitar as regras de cá em tudo quando as suas regras conflituem - o vestuário é uma delas, como se sabe, em especial das mulheres. Não devemos conceber que na nossa terra se deixe uma pessoa andar de burka, pois debaixo dela pode ate estar um homem armado - é uma questão básica de segurança. Que andem vestidas dos pés à cabeça, coim véus, etc   mas a cara destapada: e não encham as nossas ruas e as nossas praças, como sucede em França,  de rezas no chão. Assim como as nossas autoridades europeias exijam que por cada mesquita a construir seja possível nos países "deles" construir nem que seja  uma capela...Se não fosse a sujeição dos EUA, Grã Bretanha e outras nações ao petróleo da Arábia Saudita e de outros potentados medievais  só pelos   negócios, a posição do Ocidente seria diferente.