domingo, 25 de novembro de 2018

A   espuma  dos   dias
A espuma dos dias refere-se àquelas pequenas ocorrências que muitas vezes escondem problemas sérios da nossa vivência nacional ou internacional.

1 - A penúria portuguesa  - Há um caso que ilustra bem a penúria que se vive em Portugal, num problema que tem sido tratado apenas no plano da ética. Refiro-me à prática de alguns deputados de marcarem presença no Parlamento sem lá estarem; para além do aspecto, que é o mais focado, de ser  uma ilegalidade cometida precisamente pelos agentes dum órgão de Poder que regula a legalidade da vida democrática portuguesa,  na casa que é o cerne  da nossa democracia, há outro aspecto que eu chamo de revelador da penúria em que vivemos. É os deputados serem levados a esta aldrabice para não perderem o direito à senha de presença que não chega aos 70 €  !!  Com franqueza, tal é a "fome" e o desejo de  ganhar os tostões todos que for possível, que leva deputados a cometerem esta pequena falcatrua... E deve ser prática já antiga, que só por azar agora foi descoberta, e conspurca todos os deputados mesmo aqueles que nunca usaram este subterfúgio.

2 - A tragédia da estrada de Borba  -Era uma tragédia anunciada, só que sem data marcada. E ilustra bem a forma como funcionam muitos dos serviços do Estado e das Autarquias.
Se há por lei uma distância de segurança ( 30 m,  50 m ?) entre os limites da exploração das pedreiras e a berma das estradas que passarem perto, como é que durante décadas  se deixou que os limites destas pedreiras se encostassem à própria berma da estrada? Não foi de um dia para o outro que as pedreiras foram exploradas até mesmo à berma - então e as visitas anuais ( pelo menos...) de inspecção oficialmente obrigatórias a efectuar pelos Serviços competentes nunca detectaram a aproximação  cada vez mais evidente dos abismos a ladear a estrada ? E as duas Autarquias que são ligadas pela estrada nunca fizeram nada nem foram capazes de impor ao Estado uma intervenção ? E deixaram avançar as explorações ?
O último memorando a apontar a gravidade da situação ao que parece data de 2014, mas agora quer o CDS quer o PSD vêm bradar que o Estado falhou. E quando estavam no Governo em 2014 o que é que fizeram para colmatar a deficiência? Desfaçatez não lhes falta, mas o Governo da geringonça também já devia conhecer esta  situação e o que é que fez para resolver o caso da estrada de Borba?

3 - A tragédia da Síria -  É uma vergonha há demasiado tempo a prolongar-se num século que devia ser de  civilização, cultura e dignidade humana. 
Mais uma vez um dos lados do conflito voltou a atacar com gases tóxicos a população indefesa, e qualquer das partes acusa o outro de o ter feito. A Europa, que ajudou a despoletar o conflito,  comodamente acusa a Rússia ( que já nos habituou a actos de terrível carnificina) de ter feito o ataque, a Rússia acusa os aliados da Turquia, outro país que para actos de barbaridade não precisa de mais pergaminhos, e entre trocas de acusações  a dor, a morte, o sofrimento de centenas de pessoas continuam a ser discutidos nos comunicados oficiais. A ONU  não é por ter à frente  um  António Guterres  que faz seja o que for. 
É esta a Humanidade ocidental do século XXI.










quinta-feira, 8 de novembro de 2018

A espuma dos dias
1 - A ética dos deputados  - E depois admiram-se que cada vez mais pessoas duvidem da democracia e queiram soluções autoritárias.
Custa a acreditar que alguns deputados, de quase todos os Partidos ( mas não todos..,), sejam capazes destes pequenos jogos sujos de enganar a Assembleia da Republica, no que se refere à sua residência, para ganharem mais uns eurositos de ajudas de custo !! Ou faltarem e terem alguém que pica o ponto por eles. É bem um sinal da penúria deste país e da falta de ética de tanta gente que quer subir na política e , como não têm outro meio de ganhar a vida, porque nunca fizeram mais nada nem sabem fazer mais nada, agarram o lugar de deputado para sobreviverem na mediocridade e procuram esmifrar o mais que podem. Escusam de vir com desculpas esfarrapadas, ainda torna mais ridícula a situação..
2 - A fantochada de Tancos - Já não se pode mais ouvir falar das armas roubadas e parcialmente repostas de Tancos, e da exploração que sobretudo os Partidos da direita, com especial realce para os trauliteiros do CDS e a sua insuportável "Chefa", têm feito, pois pegar em casos escabrosos, mesmo que merecessem estar no segredo o tempo que fosse preciso para o resolver, não encaixa naquelas orientações de direita radical.
E têm procurado envolver o próprio PR, Marcelo Rebelo de Sousa, no encobrimento do que se terá passado, pois para a direita mais reaccionária que o CDS representa até este PR não serve - embora hipocritamente digam o contrário, não senhor, o PR é o único que tem falado verdade e, patati - patata...  Mas ainda bem que esta direita se mostra, antes assim que estar encapotada, e pouco lhe falta para desabafarem claramente e dizerem  Viva Bolsonaro!!

Enviei a dias o texto seguinte para o jornal PUBLICO, com poucas esperanças de que seja publicado, Aqui pelo menos vai ver a luz da estampa na internet

A ESQUERDA OU  É ECOLOGISTA OU NÃO É ESQUERDA

A grande inovação ideológica surgida sobretudo a partir do último quarto do século XX foi a das preocupações ambientais resultantes dos avanços da ciência da Ecologia.
Desde sempre  o ecologismo e o Ambiente , mais ou menos extremados conforme quem os assume , foram adoptados pelas forças políticas progressistas; mas ainda hoje há quem defenda que as alterações climáticas são apenas fruto dos ciclos do planeta – são os mesmos que dizem terem acabado as ideologias de esquerda e direita, só existe a ideologia  dominante que é a “realidade” ou seja o  mercado.
Na Europa depois da 2ª Guerra Mundial acentuaram-se as ideologias democráticas de esquerda – seja o socialismo democrático ou social democracia, seja a “esquerda” da direita que é (era…) a democracia cristã. Ambas nasceram como reacção quer ao marxismo quer ao liberalismo que nos finais do século XIX se confrontavam e impunham ditaduras, fosse a do proletariado fosse a do deus dinheiro do laissez faire, laissez passer.
Os ideólogos da social democracia, desde os do socialismo utópico até aos das diversas variantes que se desenvolveram e a democracia cristã saída da Igreja depois da Encíclica Rerum Novarum, procuravam sistemas de maior protecção social e de mais justiça democrática, sem pôr em causa os pilares essenciais da liberdade e da democracia. Mesmo países de maioria religiosa protestante acataram as propostas da democracia cristã, coisa que hoje nem os mais fervorosos católicos ( pelo menos no discurso) já acatam, rendidos como estão aos cantos de sereia do liberalismo.
As preocupações ambientais passaram a fazer cada vez mais parte das propostas que se orientavam por aquelas ideologias; mas  sobretudo a esquerda  socialista e social democrata assumia-as com maior empenho.
A erosão que se verifica na esquerda democrática de alguns anos a esta parte, e a cedência da direita democrática cada vez mais aos ditames  do liberalismo financeiro, têm tido como  consequência o crescimento de franjas ideológicas  : por um lado a extrema direita que ganha terreno , por outro lado o realce cada vez mais notório de partidos ecologistas ou “verdes”, que se podem dizer de extrema esquerda.
A perda de importância própria nos partidos social democratas europeus ( com maior gravidade na Alemanha mas um pouco noutros países) resulta a meu ver de não terem sabido actualizar a sua ideologia e,  entre outras causas, aos problemas ambientais e ecológicos contemporâneos.
A experiência governativa de esquerda ensaiada em Portugal, para além, de ser um espécie de alerta para a Europa de que é possível governar à esquerda, tem tido , entre outros, como grave deslize. a perda da sua sensibilidade ambiental e ecologista.  A Política de Ambiente, aceites como foram, sem pestanejar, as alterações institucionais  concretizadas pelo último governo de direita, perdeu toda a sua capacidade de intervenção global e transversal nos sectores da economia. É inevitável ter de  voltar a falar no descalabro da política florestal, mas também a defesa que o Ministério do Ambiente chegou a fazer da continuidade da  exploração petrolífera no Algarve, a condescendência face á poluição provocada pela industria da celulose no rio Tejo e, como denunciou o Prof. Jorge Paiva, no mar da zona da Leirosa, o ajoelhar face á continuidade da central nuclear de Almaraz, o caos nos Parques Naturais com uma organização ineficaz, a junção do ICN com as florestas ao encontro dos desejos especulativos da floresta industrial e da actividade urbano-turística, etc, etc- é só um pedaço da longa lista de ineficácias.
Esperava-se que a actual  governação de esquerda assumisse uma política ambiental e ecologista condigna com  as ideias mais  progressistas , não tanto  pelo PS que nunca foi ambientalista, mas pelos partidos de esquerda que o apoiam –afinal nem se fala dessas matérias, todos ficam indiferentes  à falta de políticas que garantam a perenidade, isto é, sustentabilidade do território.
E uma esquerda do séc. XXI que não seja ecologista não é esquerda.
Fernando Santos Pessoa, arq.ºpaisagista
31-Out-018