Enviei a dias o texto seguinte para o jornal PUBLICO, com poucas esperanças de que seja publicado, Aqui pelo menos vai ver a luz da estampa na internet
A ESQUERDA OU É ECOLOGISTA OU NÃO É ESQUERDA
A grande inovação ideológica surgida
sobretudo a partir do último quarto do século XX foi a das preocupações ambientais
resultantes dos avanços da ciência da Ecologia.
Desde sempre o ecologismo e o Ambiente , mais ou menos
extremados conforme quem os assume , foram adoptados pelas forças políticas
progressistas; mas ainda hoje há quem defenda que as alterações climáticas são
apenas fruto dos ciclos do planeta – são os mesmos que dizem terem acabado as
ideologias de esquerda e direita, só existe a ideologia dominante que é a “realidade” ou seja o mercado.
Na Europa depois da 2ª Guerra Mundial
acentuaram-se as ideologias democráticas de esquerda – seja o socialismo
democrático ou social democracia, seja a “esquerda” da direita que é (era…) a
democracia cristã. Ambas nasceram como reacção quer ao marxismo quer ao
liberalismo que nos finais do século XIX se confrontavam e impunham ditaduras,
fosse a do proletariado fosse a do deus dinheiro do laissez faire, laissez passer.
Os ideólogos da social democracia, desde os
do socialismo utópico até aos das diversas variantes que se desenvolveram e a
democracia cristã saída da Igreja depois da Encíclica Rerum Novarum, procuravam sistemas de maior protecção social e de
mais justiça democrática, sem pôr em causa os pilares essenciais da liberdade e
da democracia. Mesmo países de maioria religiosa protestante acataram as
propostas da democracia cristã, coisa que hoje nem os mais fervorosos católicos
( pelo menos no discurso) já acatam, rendidos como estão aos cantos de sereia
do liberalismo.
As preocupações ambientais passaram a fazer
cada vez mais parte das propostas que se orientavam por aquelas ideologias;
mas sobretudo a esquerda socialista e social democrata assumia-as com
maior empenho.
A erosão que se verifica na esquerda
democrática de alguns anos a esta parte, e a cedência da direita democrática
cada vez mais aos ditames do liberalismo
financeiro, têm tido como consequência o
crescimento de franjas ideológicas : por
um lado a extrema direita que ganha terreno , por outro lado o realce cada vez
mais notório de partidos ecologistas ou “verdes”, que se podem dizer de extrema
esquerda.
A perda de importância própria nos partidos
social democratas europeus ( com maior gravidade na Alemanha mas um pouco
noutros países) resulta a meu ver de não terem sabido actualizar a sua
ideologia e, entre outras causas, aos
problemas ambientais e ecológicos contemporâneos.
A experiência governativa de esquerda
ensaiada em Portugal, para além, de ser um espécie de alerta para a Europa de
que é possível governar à esquerda, tem tido , entre outros, como grave deslize.
a perda da sua sensibilidade ambiental e ecologista. A Política de Ambiente, aceites como foram,
sem pestanejar, as alterações institucionais
concretizadas pelo último governo de direita, perdeu toda a sua
capacidade de intervenção global e transversal nos sectores da economia. É
inevitável ter de voltar a falar no
descalabro da política florestal, mas também a defesa que o Ministério do
Ambiente chegou a fazer da continuidade da
exploração petrolífera no Algarve, a condescendência face á poluição
provocada pela industria da celulose no rio Tejo e, como denunciou o Prof.
Jorge Paiva, no mar da zona da Leirosa, o ajoelhar face á continuidade da
central nuclear de Almaraz, o caos nos Parques Naturais com uma organização
ineficaz, a junção do ICN com as florestas ao encontro dos desejos
especulativos da floresta industrial e da actividade urbano-turística, etc,
etc- é só um pedaço da longa lista de ineficácias.
Esperava-se que a actual governação de esquerda assumisse uma política
ambiental e ecologista condigna com as
ideias mais progressistas , não
tanto pelo PS que nunca foi
ambientalista, mas pelos partidos de esquerda que o apoiam –afinal nem se fala
dessas matérias, todos ficam indiferentes
à falta de políticas que garantam a perenidade, isto é, sustentabilidade
do território.
E uma esquerda do séc. XXI que não seja
ecologista não é esquerda.
Fernando
Santos Pessoa, arq.ºpaisagista
31-Out-018
Sem comentários:
Enviar um comentário