quarta-feira, 28 de setembro de 2022

Há dias escrevi este desabafo que aqui deixo... 

A anemia da política do Ambiente

O Ambiente antes de ser defendido tem de ser construído. O simples facto de termos que propor a defesa do Ambiente – e então no estado a que chegou hoje em Portugal!– é bem representativo da situação a que se chegou.

Entre 20 e 21 deste mês de Setembro realizou-se no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa um encontro de comemoração da célebre Conferencia de Estocolmo que se teve lugar na capital sueca em Junho de 1972; o encontro foi coordenado pela Prof.ª Dr.ª Luísa Schmidt com a colaboração de outros docentes, com destaque para o Prof. Pedro Prista.

Durante dois dias reputados investigadores e especialistas (e alguns activistas como eu) reflectiram sobre o caminho percorrido no que se refere ao Ambiente, no mundo e no nosso país. E, para lá de eventuais diferentes posições político-partidárias, o que sobressaiu desses debates foi uma consciência, comum a todos, do mau tratamento que se foi dando às questões ambientais e que se podem sintetizar hoje nas consequências das alterações climáticas e na biodiversidade.

O que devia preocupar as pessoas, sejam os políticos e governantes sejam os cidadãos, é que ao nosso nível nacional, se tem praticado apenas uma retórica fácil, publicando legislação que não se cumpre e trocando políticas assertivas por outras desarticuladas; e ao nível das grandes decisões mundiais a falta de coesão social para com milhões de seres humanos desfavorecidos que não podem- mesmo que soubessem e quisessem – assumir comportamentos menos predadores. Mas a maior predação é feita pelas grandes potências e pelos grandes grupos económico-financeiros que controlam a vida dos povos.

Entre o aparente domínio do Homem sobre a Terra- e sobre os obstáculos que a Natureza opõe às actividades lesivas dos seus equilíbrios dinâmicos, geo-ecológicos e paisagísticos- e a realidade que a Ciência nos vai revelando, o que se verifica é que afinal estaremos a caminhar para uma derrota do Homem.

O crescimento imparável da população mundial e a continuada sobreexploração dos recursos, renováveis e não renováveis, são fenómenos que a partir do século XIX se tronaram responsáveis pelas condições ambientais cada vez mais gravosas que afectam os povos, mais uns do que outros, sendo que os mais desfavorecidos continuarão a pagar um preço duma situação para a qual menos contribuíram.

Como se isso não bastasse os produtivistas continuam a proclamar que estes argumentos são patetices e exageros, no fundo uma utopia, para poderem continuar as suas actividades predadoras.

Portugal ainda em tempos do período “marcelista” esteve presente em Estocolmo por um dos poucos políticos da altura que entendia já o Ambiente, o Eng.º Correia da Cunha, nomeado presidente da Comissão Nacional do Ambiente que tinha sido criada em 1971. Eram os primeiros passos a acertar com o tempo que corria.

E é relevante referir que no texto final daquela primeira Conferencia sobre Ambiente, promovida pela ONU, se proclamavam conceitos fundamentais: “O homem tem direito à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de vida adequadas a um ambiente de qualidade” mas também “O homem tem a responsabilidade especial de preservar e administrar judiciosamente o património natural”

Mas foi só depois do 25 de Abril de 74 que se assistiu à implementação de uma políptica de Ambiente alicerçada em criteriosos fundamentos ecológicos, e na qual os dois pilares fundamentais sempre foram a Conservação e o Ordenamento do Território.  Com estas bases foi sendo publicada legislação fundacional como a Reserva Agrícola Nacional (RAN) a Reserva Ecológica Nacional (REN), a Rede Nacional de Áreas Protegidas, os PDM e os PROT. Entre muitos outros, Delgado Domingos, Gomes Guerreiro, Viana Barreto, Ilídio de Araújo, Carlos Pimenta e sobretudo Gonçalo Ribeiro Telles construíram uma politica de salvação nacional.  Durante décadas esta política impediu um maior desordenamento do espaço biofísico, e uma maior destruição dos equilíbrios naturais bem como a salvaguarda dos valores da biodiversidade. Porém tudo mudou.

Valores contraditórios a todos estes, numa politica comprometida,  provenientes de indústrias poluentes como a da celulose com a expansão descontrolada dos eucaliptais (continua a sair legislação a suportar essa expansão), defeituoso planeamento de transportes públicos, excesso de betão armado e alcatrão em vez de apoio a ferrovia etc, afastaram o nosso Pais dos parâmetros da boa política. Desarticulado o sector agro-florestal com agricultura e florestas em tutelas diferentes, desmembrada a políptica ambiental separando a Conservação do Ordenamento do Território ((porque deve dar jeito a alguém…), até as Áreas Protegidas cujo ordenamento se opunha á expansão dos eucaliptais, caíram num caos de gestão, patente no que vai sucedendo aos Parques Naturais da Serra da Estrela, do Alvão, etc.

É este o “caminho do futuro” que renega tudo quanto saiu da Conferencia de Estocolmo – uma anemia progressiva do Ambiente em Portugal.

22/09/2022

sábado, 24 de setembro de 2022


 "Pequenas" coisas pelo mundo e por cá

Ao fim de uns dias de férias, que desta vez foram mais longe, revisitar a velha Hellas, e de várias obrigações fora de casa, não faltam "pequenas" coisas para registar...

50 anos da Conferência de Estocolmo

Há 50 anos a Conferência de Estocolmo (C E) lançou as bases e a obrigação para todos os países se preocuparem com as questões do Ambiente. 

Eu participei nas comemorações dos 50 anos da CE organizadas entre 20 e 21 deste mês no Instituto de Ciências Sociais pela irrequieta e entusiasta Luísa Schmidt coadjuvada por outros docentes com realce para o Pedro Prista. Foi um evento muito participado por especialistas e activistas ( é  meu caso) e que pouco ou nada motivou a comunicação social. Aqui vai o que eu disse por lá:


Conferência de Estocolmo

50 anos depois da realização da Conferencia de Estocolmo os dois principais problemas com que a Humanidade hoje se defronta parecem-me ser as consequências das alterações climáticas e o subdesenvolvimento que afecta grande parte da população mundial, mesmo até em países que oficialmente e na aparência se apresentam como sendo desenvolvidos. Tão ou mais importante que o subdesenvolvimento material é o subdesenvolvimento intelectual que impede a formação de uma massa critica activa e interveniente, nomeadamente sobre as questões ambientais.

A grande compreensão mundial sobre a necessidade de defender o Ambiente terá começado com Janes Lovelock quando lançou a sua ideia da Gaia, o sistema vivo que só é mantido se nós o soubermos manter; depois em 1972 a Conferência de Estocolmo como que obrigou todos os países a preocuparem-se com o assunto.  Nessa célebre Conferência ouvimos declarar que “ o homem tem direito fundamental à liberdade ( logo a liberdade à frente de tudo!!), à igualdade e ao desfrute de condições de vida adequadas a um ambiente de qualidade” e também : “o homem tem a responsabilidade especial de preservar e administrar judiciosamente o património natural e os seus habitats”

Portugal, em pleno “marcelismo”. criou então em 1971 a Comissão Nacional do Ambiente, entregue a um dos poucos políticos portugueses da altura que conhecia a situação – o Engº Correia da Cunha, pessoa muito competente e de amplo diálogo, sempre com fortes bases de conhecimento, que muito ajudaram a ampliar a compreensão pública das questões ambientais. E criou-se também em 1971 o Parque do Gerês, classificado como nacional.

 

Olhemos então para Portugal:1

1- o interior despovoado 

 2- o sector agro-florestal desmantelado

3- a política de Ambiente desarticulada

4- a passividade cívica de grande parte da população, assoberbada com problemas do dia a dia e indiferente às questões ambientais.

Abordemos, pois, estas questões

1- Desde que um Governo na década de 90 do século passado decidiu dar subsídios aos pequenos e médios agricultores para deixarem de produzir, milhares de hectares de solos agricultáveis foram abandonados e a falta de actividades no mundo rural atirou milhares de pessoas jovens para as cidades. Muitos dos solos acabaram plantados com eucaliptos sem que tivesse havido um ordenamento florestal que permitisse localizar esses povoamentos estremes apenas e só onde eles tivessem lugar sem interferir com as outras culturas. E outros milhares de hectares de solos ficaram simplesmente abandonados. Mas ainda agora continua a sair legislação para ampliar a área de eucaliptais como tem sido denunciado por ONGs.

2- O sector agro-florestal foi sendo desarticulado e chegou ao extremo actual de agricultura e “floresta” estarem em Ministérios diferentes, dizendo que este é o caminho actual para o futuro.  

 Começou com a extinção dos Serviços Florestais, que existiam desde o século XIX, instituição fundamental para a defesa do Ambiente.

Durante décadas a quadrícula de pessoal florestal distribuído pelo território garantiu o controle dos fogos rurais, porque os focos de incêndio eram detectados geralmente logo no início e possibilitavam uma intervenção atempada. Pessoal florestal e bombeiros eram então suficientes para controlar os fogos. Agora todos os anos se gastam milhões e milhões com os incêndios só porque seguimos este “caminho de futuro”.

 -A política agrícola tem privilegiado e subsidiado os pomares de regadio intensivo, sem cuidar do recurso água, esquecendo as culturas alimentares e forrageiras de que o País tem carência, nas pequenas e médias explorações.

Ora, as preocupações com o Ambiente e com os processos ecológicos não são pertença de qualquer profissão específica, podem citar-se muitos exemplos de grandes personalidades envolvidas nestas matérias provindo das mais diversas formações científicas.  Mas é forçoso reconhecer que em Portugal, onde as especializações por vezes estreitaram a visão global do Meio, coube aos arqº. paisagistas, pela sua formação generalista e de síntese das Ciências da Terra e da Arte, a oportunidade de se destacarem na reflexão e definição da política de Conservação indispensável ao Ambiente tal como ao Ordenamento do Território, que entre nós se entendeu sempre como ordenamento paisagístico.

Sem esquecer outros participantes que se revelaram fundamentais para a definição e execução da Política de Ambiente - e não deixarei de citar pelo menos os Prof. Delgado Domingos e Manuel Gomes Guerreiro e o Eng.º Carlos Pimenta – recaiu pois sobre os arqº paisagistas o grande papel fundacional dessa política, quer com Francisco Caldeira Cabral e logo com Gonçalo Ribeiro Telles que soube apoiar-se, entre muitos outros colegas, em António Viana Barreto e Ilídio Alves de Araújo, dois pilares inesquecíveis da política ambiental.

As Áreas Protegidas – Parques Naturais e Reservas Naturais- deixaram de ter a sua direcção e perderam a sua ligação com as populações locais; os planos de ordenamento não são cumpridos  e a tragédia recente da Serra da Estrela é o último exemplo; já arderam áreas significativas pelo menos nos Parques Naturais do Alvão e da Serra d’Aire e Candeeiros; a Serra de Montemuro (1999), nunca viu o seu plano de ordenamento ser aprovado - agora é um vasto eucaliptal. Hoje Conservação e Ordenamento, os dois pilares do Ambiente, estão em tutelas diferentes- porquê?      Porque  dá jeito a alguém.

Suportada pela Lei de Bases do Ambiente (1987) durante décadas, a política de Ambiente, permitiu ao País escapar a um pior desordenamento e a uma maior destruição dos equilíbrios dinâmicos, ecológicos e paisagísticos, até que surgiram uns sobredotados que resolveram inventar a pólvora e criaram o caos a que, se quisermos ser sérios, todos os cidadãos assistem impávidos e onde, quem aponta o dedo, é acusado de estar ultrapassado pela modernidade.

50 anos depois da Conferencia de Estocolmo que cada um faça o seu juízo!!

20-Set- 022

A sabedoria de Teixeira dos Santos

" Costa Silva tem de perceber que quem fala sobre impostos é o ministro das Finanças" - ora esta é a experiência de um Ministro das Finanças,  do melhor que já tivemos em Portugal, o do Governo salvador de Sócrates.  Lá que ele sabe da poda...

A guerra continua

E por muitas actividades menos lícitas. por muitos defeitos que tenha o Zelensky e as tropas ucranianas, tudo quando de mau e de feio eles estejam a cometer estão a fazê-lo na sua terra e para se defenderem; quem ataca da maneira suja um país independente, queira ou não aliar-se à NATO, queira ou não ser da UE, tudo isso não justifica os crimes que os russos cometem.

O mais evidente nesta guerra é o falhanço militar da Rússia, incapaz de derrotar, quando julgava que era fácil, uma Ucrânia mais fraca e que vai recebendo ajuda estrangeira - a tal paz que os comunistas e quejandos querem é o fim à corrida ao armamento, pois claro!!  A prova de falhanço miliar dos russos é talvez o facto internacional mais espectacular e surpreendente, além das consequências económicas que vai tendo para todos nós. Uma vergonha. Não se pode eticamente é estar com um pé em cada lado, temos que tomar posição pelo agredido ou pelo agressor.

No jornal de hoje vem um artigo do Pacheco Pereira, que ainda não li - fica para o serão - cujo título é " Quando  é que o PCP convoca uma manifestação pela paz contra Putin?".

 A resposta é simples, já a disse o incrível ministro russo do Negócios Estrangeiros e o csar Putin disse-o antes : se o ocidente deixar de fornecer armas à Ucrânia  a guerra acaba logo, já podia ter acabado. É a tal paz do invasor, com os mesmos objectivos que Hitler tinha quando queria aumentar o seu Império justificando  com a protecção aos povos germanófonos e germanófilos. Agora são os povos russófonos e russófilos, e se tiver êxito com a Ucrânia que se  cuidem os outros países. 

Porque será que o PCP  tem tanto amor aos russos invasores de um país independente? Talvez seja porque restaurar o Império soviético é um sonho,  pode dar a esperança de voltar a criar-se o velho Império do grande sol que iluminou o mundo atá cair de podre... Curioso - ou talvez não - é que ao lado do PCP e dos intelectuais da esquerda envergonhada que só dizem leves queixumes, estão a direita radical e   a extrema direita europeia  e mundial.









quinta-feira, 1 de setembro de 2022

 E depois dos incêndios

A tragédia dos incêndios ainda não acabou e, certamente com o Verão prolongado que se avizinha nem os incêndios acabaram. Temo pelo Sul, pela Arrábida e pelo Algarve onde em Setembro ocorrem  fogos, aqui pelo barrocal.

Mas a grande  tragédia  que se abateu e abate sobre as serras conclui-se com as chuvas de Outono e Inverno, sobretudo sempre que sejam de regime torrencial como é característico das condições mediterrânicas alargadas pela alteração do clima ( será que ainda há negacionistas a preferirem os seus negócios, os seus pomares de regadio com esse gasto supérfluo de água e outras teorias negacionistas?).

Um dado difícil senão impossível de calcular, mas que deve dar um número astronómico,  são os m3 de água gastos pelo combate terrestre e aéreo aos incêndios, água toda ou quase toda originada nas albufeiras  que já estão em grande parte nos seus limites mínimos- água que tanta falta fará para o consumo humano  - não é trágico ?

Mas pior talvez : com as chuvas serão milhares e milhares de toneladas de cinzas e terras finas que vão escorrer pelas encostas, correr pelos talvegues e entupir ribeiras e albufeiras.

Existiu em tempos ( que será feito ?) nos S. Florestais um Serviço de Correcção Torrencial, com sede em Leiria,  fundado e chefiado por um técnico de renome mundial nessa matéria, o Engº Mário Galo. Ele inventou um tipo de barragem evolutiva que se implanta nas pequenas linhas de água e represa os carrejos que venham encosta abaixo, podendo regularmente ser aumentada. Eu tenho esse projecto e construi bastantes nas linhas de água de Porto Santo.

Creio que hoje já ninguém liga a isso, é uma despesa de que não se vê resultados evidentes e por isso não dá votos (  tal como reparar as perdas de água nas redes de distribuição urbana, estima-se em 40%, porque é dinheiro a "enterrar" e também não dá votos...

Ninguém se lembra de fazer o aproveitamento dos nateiros que se acumulam no fundo das albufeiras e este ano, em que estão tantas delas em reservas mínimas (por toda a Europa também), era possível gastar uns milhões que a Europa nos manda para escavar esses fundos das albufeiras. Primeiro porque se aumentava a capacidade de armazenamento, e depois porque aquele solo acumulado nos fundos e agora a descoberto é o melhor solo que saiu das encostas, podia perfeitamente ser reutilizado em regiões onde o solo é fraco.  Mas por cá  preferimos gastar o dinheiro noutras coisas mais evidentes