Continua a surpreender-me a quase histeria dos activistas contra a despenalização da eutanásia e a posição dogmática de instituições como a Ordem dos Médicos. que deviam manter um estatuto de alguma independência.
O grande argumento dos que querem agora um referendo é que a Assembleia da Republica não terá legitimidade para decidir sobre o assunto, quando ele afecta muitos portugueses que estão contra o processo. Mas na discussão do assunto, na anterior legislatura, esses mesmos defensores hoje do referendo aceitaram a discussão e a decisão parlamentar sem a pôr em causa, porquê? Porque sabiam que iam ganhar. É esta hipocrisia que não têm a honorabilidade de reconhecer.
Custa a aceitar que estes paladinos da vida que não é possível afrontar, como eles dizem, fiquem indiferentes ao mais simples dos argumentos : quem defende a despenalização da eutanásia não está a impor esse acto a ninguém, está apenas a exigir que cada um possa querer, para si, a eutanásia - enquanto que os opositores querem impor a toda a gente a sua própria opinião.
E estão-se pouco importando em reconhecer que este processo é inevitável, que é apenas uma questão de tempo para que a reacção, os reaccionários, percam influência na sociedade portuguesa. Acusam também de ainda poucos países terem feito essa opção - e depois ? Há povos que têm de ir na frente da evolução da Humanidade.
Fomos dos primeiros povos a abolir a escravatura - se tem havido um referendo e tendo em consideração a mentalidade geral da época, se calhar não tínhamos dado esse passo significativo no avanço da civilização europeia. Passou-se o mesmo com a abolição da pena de morte - se tivesse havido um referendo é provável que tivesse continuado essa pena máxima abominável.
Quanto a instituições, já se sabe que a Igreja católica foi sempre a reboque da sociedade, pondo travões, reagindo pela negativa - não admira que agora faça homilias nas missas e assuma posições ultra reaccionárias. E o mesmo com as outras religiões, que sentem fugir-lhes o apoio das grandes multidões que antes as apoiavam...
Já a Ordem dos Médicos devia ter pudor em vir tão afrontosamente opor-se à despenalização da eutanásia, quando sabe que pelos inquéritos feitos mais de metade dos clínicos está de acordo com o processo, e alguns até confessam que já a praticaram em segredo. -o que só fala do elevado grau de misericórdia desses médicos.
E por sinal, numa posição muito digna, as Misericórdias embora dizendo que não concordam com a despenalização declaram que estão no entanto ao dispor de quem recorrer à eutanásia para receber e cuidar desses pacientes.
Veremos esta semana se vence a reacção ou a evolução...
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