REGIONALIZAÇÃO?
De
vez em quando fala-se na regionalização – e eu sou um dos que me interrogo
sobre as vantagens ou não de a adoptar. Por isso vou avançar com algumas ideias .
Historicamente
não temos tradição de descentralizar os poderes centrais para as regiões,
talvez porque, tirando o Algarve, de características mais acentuadamente
mediterrânicas e que foi um Reino “anexado” até à instituição da República, nunca
se definiram em Portugal verdadeiras regiões político-económicas. E porque também
não existem diferenças étnicas , linguísticas ou outras suficientemente importantes para
terem peso institucional.
Regiões
biofísicas, essas sim, temos - e num relativamente pequeno território como
o nosso são profundas as diferenças naturais de umas para as outras, verdadeiro
mosaico eco- geográfico - mas não se afirmaram nunca como identidades de
governação autónoma. Falou-se sempre em poderes condais de aquém e além Douro,
de entre Douro e Mondego, etc, mas o poder real acabou por centralizar a
governação.
O
poder real, desde os primórdios da nacionalidade, baseou a descentralização nos
municípios, uma forma também do Rei se distanciar da nobreza – e, não sendo eu historiador,
creio poder afirmar que o feudalismo foi entre nós pouco significativo, sendo
dados ao povo, através dos forais, poderes autárquicos sucessivamente renovados
que o libertavam da submissão à nobreza.
Mestres
como José Matoso falam da nobreza medieval como uma nobreza rural que a Coroa
incentivava e nas quais se apoiava - ricos-homens, infanções e cavaleiros-
precisamente porque interessava ao Poder diminuir a força da nobreza condal, bastas vezes irrequieta e comprometedora da autoridade real e podendo dar azo a
poderes regionais. Outros historiadores, como hoje João Paulo Oliveira e Costa,
defendem igualmente o caracter municipalista que predominou em Portugal ao
longo dos séculos da História.
Apenas
as ilhas atlânticas, pela suas localizações afastadas do continente, tiveram sempre mais poderes regionais, através de
governadores nomeados pelo poder central. Mas com o caciquismo sempre à espreita…
Evidenciaram
-se sempre em Portugal duas grandes regiões, uma a norte e a outra a sul do rio
Tejo sendo que este, na realidade, funciona como uma fronteira natural - e
poderiam essas ter resultado em poderes regionais diferenciados, atendendo que no
Norte, mesmo antes da nacionalidade, houve a forte influência suévica com a
divisão paroquial e a Sul o predomínio muçulmano, onde apenas resistiram as
dioceses que o islão basicamente aceitou.
Claro
que o poder local ou autárquico também pode dar lugar ao caciquismo e não
faltam exemplos no nosso país, mas é sempre mais volátil e passível de reversão
porque as pessoas conhecem-se de perto e sabem impor travões - ou o poder
central intervém para repor casos mais gravosos.
No
fim, para mim que sou municipalista,
entendo que a descentralização administrativa deve recair sobre associações de
municípios, sem prejuízo de alguns sectores, como o Ambiente e o agro-florestal
(porque a Natureza não tem fronteiras) que devem ser tutelados por uma política
nacional embora participada localmente, não regionalmente.
Não me chocam umas CCDR para as grandes regiões-plano desde que passem a ser democraticamente escolhidas pelos munícipes e respondam directamente às necessidades intermunicipais. Mas isso não significaria a institucionalização da regionalização, antes a verdadeira descentralização em favor das autarquias. Mesmo neste caso não se pode ( não se deve) estar perante um acto tão sério de alterar a governação do Pais só porque conjunturalmente existe uma maioria absoluta de um Partido.
Proceder a uma transformação destas, sub-repticiamente como se está a fazer agora, sem obter no mínimo uma votação favorável de 2/3 dos deputados, é claramente um abuso de poder. Seria bom que os portugueses aprendessem que uma maioria absoluta de um só Partido, seja ele qual for, é um risco, como de resto tem vindo a acontecer em vários países ocidentais que são ( ainda são ?) democracias.
Por isso interrogo-me: regionalização? Para quê
multiplicar estruturas de governo e poderes de decisão se temos historicamente,
desde o tempo dos forais, as autarquias locais?
Entretanto publicado no Sul Informação
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