quarta-feira, 5 de julho de 2017

Venturas e desventuras dum Governo


O Governo que tem estado a governar sob a sigla de "geringonça" estava a tornar-se um caso de sucesso pouco habitual para as regras deste país, onde a politiquice toma muitas vezes o lugar do bom senso e do decoro. Os avanços sociais e económicos muito acima do que toda a gente esperava, tem sido motivo de elogios internacionais até de organismos de onde haveria pouco a esperar.
De uma semana para a outra o estado de graça caiu a pique, e convém parar um pouco para reflectir, passado o mais "quente" da surpresa sobre os factos inomináveis que ocorreram.
1 - Assisti, como milhões de portugueses, e de espanto em espanto, ao desenvolvimento do fogo da região de Pedrógrão, e como já vi e até bem de perto alguns fogos florestais,  fiquei surpreendido com a rapidez com que o incêndio progredia. 
Sabe-se que o fogo de copa, nomeadamente em pinhais e eucliptais, progride depressa e, com o sub bosque repleto de material combustível , com a falta de desbaste e limpeza do arvoredo ( as imagens das matas ardidas pareciam paliteiros, tal era a densidade de paus  que ficaram de pé) e com ventos favoráveis, o fogo tende a caminhar com rapidez - mas não na forma como aconteceu. As pessoas falavam em línguas de fogo que passavam por cima das suas cabeças, em chuva de fogo e outras expressões que vão muito para além do que acontece num incêndio florestal, mesmo de grandes proporções.
Finalmente o estudo científico do fenómeno, que não se faz de um dia para o outro e sob pressão, acaba por nos dizer que ocorreram um ou mais fenómenos meteorológicos pouco frequentes, mas não raros, conhecidos por downburst, que estarão na causa da dispersão fulgurante dos incêndios. O ar muito quente origina colunas descendentes de ar frio, com muita energia, que chegam ao solo e se dispersam em todas as direcções. Isso acontece  com alguma frequência nomeadamente no Alentejo, só que o grande azar foi a coincidência de  pelo menos um desses fenómenos ter acontecido sobre o incêndio que lavrava.
Houve  certamente várias falhas de comunicação, houve descontrole dos comandos do incêndio, houve certamente outras causas  humanas que não deveriam ter acontecido, ( mas que acontecem muitas vezes no meio de um incêndio florestal e nem se dá por isso ) e o que aqui digo não é para desculpar essas falhas - em condições meteorológicas normais, o incêndio teria crescido e teria progredido mas não da forma descontrolada que ocorreu.
E isto faz toda a diferença.
Vieram então uns "especialistas" que se formaram de repente em alguns órgãos de comunicação social, e também por acaso ligados à direita e aos interesses das grandes empresas de celulose, apostrofar quem se demarca da expansão do eucalipto, embora todos eles dizendo-se que não têm qualquer simpatia pelo eucalipto... Eu por mim já reconheci que o facto dos eucaliptais propriedade das empresas de celulose serem dos que menos ardem, é  porque têm aquilo que andamos muitos a denunciar há décadas: porque são ordenados e limpos o que não acontece às restantes matas, porque já não há guardas florestais nem sapadores suficientes para ordenarem e limparem a área florestal portuguesa. Mas que a área de eucalipto deve ser  restringida é uma condição básica para uma política de gestão florestal correcta.
Portanto muitos dos políticos e "especialistas"que se apressaram a gritar impropérios contra a ineficácia do Governo ( é sempre o mais fácil de apregoar) se tiverem um resto de pudor e bom senso, calem-se e meditem no que pode acontecer e ultrapassar a capacidade humana de resposta.
2 - O outro caso é o assalto aos paióis de Tancos.
Este refere-se a  um dos sintomas mais graves da nossa sociedade portuguesa. Ninguém acredita que um assalto daquela natureza, com aquela escolha de material a roubar, com a eficácia com que decorreu, pode ter acontecido sem a conivência e a intervenção de pessoas lá de dentro. 
Pode haver e certamente há,  falta de verbas  para reparar a rede, e outras coisas desse tipo. Mas então há quantos anos aqueles paióis estão assim ? 
Neste tipo de  armazém não basta o cabo quarteleiro que eu tinha na minha Companhia, para vigiar o paiol. Então não deveria ter portas especiais de segurança máxima, até com código de abertura ? Pedir  ao Ministro que se demita, é fácil ,ele é tão responsável directo como foram os Ministros dos Governos anteriores. Com quatro ou cinco unidades a funcionar em Tancos, não há militares suficientes para patrulhas e vigilância  aos paióis ? Foi por acaso ou coincidência  que não houve vigilância durante uma data de horas precisamente na altura escolhida para o assalto ? Alguém duvida da mãosinha lá de dentro ?
Um assalto destes obrigou a ajuda de dentro, o que significa corrupção. Esse é o sintoma que eu assinalei logo de início. Já temos casos de corrupção que cheguem na vida publica, em pessoas da governação, até nas polícias, até  entre magistrados,  -  agora nas Forças Armadas ? 

Sem comentários:

Enviar um comentário