Democracia e governação - o que nos falta
Já tenho deixado a indicação que estas notas que escrevo são sobretudo para mim mesmo, para minha memória futura, embora venham a ser lidas por quem aceder ao blogue. Mas não pretendo entrar em polémicas ou desaguisados - quem não concordar e não gostar, pronto, não lê. Não impinjo a ninguém...
Este ano comemoram-se 47 anos da chegada da democracia a Portugal, graças ao movimento de uns militares progressistas e moderados que souberam suster os extremismos dos dois lados do espectro. Embora com altos e baixos a população portuguesa tem sabido mostrar-se digna do regime que permite a todos a liberdade - até àqueles que se servem dela e, se puderem, a liquidam. Estivemos mais de quarenta anos sem uma extrema direita visível, estava escondida no CDS e no PSD, como se revelou desde que esse grupelho de proto fascistas, fascistas e até, segundo o que a comunicação social às vezes informa, nazis, apareceu na praça publica.
Do outro lado temos um PCP que é apenas uma aberração ao manter-se fiel - não ao marxismo ( o que até poderia considerar-se uma evolução, como por exemplo Carlos Brito e outros têm exposto) - ao leninismo, que foi uma adaptação a uma sociedade feudal como era a russa, de uma teoria pensada para as sociedades industrializadas e modernas do finais do século XIX e inícios do século XX. Mal de nós se voltássemos à ditadura do proletariado e à democracia popular que eu visitei em vários países europeus ou em Cuba, mas que ainda leva os comunistas a dar vivas à democracia dinástica da Coreia do Norte... No entanto o PCP, ultrapassado que foi o período mais acérrimo da revolucionarite, adaptou-se ao regime democrático e foi uma peça fundamental para empurrar o PS, durante a geringonça, para a tomada de medidas sociais que, de outra maneira, António Costa não teria tomado.
E temos o BE, um conglomerado que juntou comunistas de outras tendências e onde, com o tempo, parece que se vão esbatendo os mais extremistas e caminha para uma social democracia mais avançada, com repúdio de muitos dos valores dos marxistas leninistas. Mas daí a chamar extrema esquerda a estes dois partidos só mesmo por enviesamento da direita, ignorando o contributo que têm dado para a melhoria do Estado Social - claro que os liberalistas ( liberal sou eu,,) não se cansam de propalar quem mais se opõe ao mercado livre do laisser faire laisser passer.
O PS já teve a sua fase mais neoliberal e recordo que até eu, que não sou um especialista em ciência política, escrevi em Dezembro de 2005 uma crónica sobre o socialismo liberal do Pinto de Sousa ( deixo o Sócrates para o insigne filósofo grego..). A ala esquerda do PS tem estado mais activa e foi responsável pela abertura à esquerda.
Mas há ainda muitas falhas e o que eu acho que é imperdoável aos governos de esquerda democrática, mais do que exigiria a governos da direita democrática, é não terem contribuído de forma mais decisiva e eficaz para que o Estado Social de Direito seja mais forte e menos atreito às concessões ideológicas que as direitas procuram sempre impor. É que, se a esquerda democrática - o socialismo democrático ou social democracia - se deixou impregnar por laivos do liberalismo, e já citei várias vezes alusões a essa realidade - a direita democrática conservadora ou da democracia cristã então foi completamente apropriada pelas práticas liberalistas.
Já tenho citado, que tendo nós segundo números do INE cerca de 13% de trabalhadores do Estado, a média europeia anda pelos 17% e essa diferença de uns 4% para a média europeia actual já permitiria que tivéssemos serviços públicos com efectivos suficientes para realizarem as principais tarefas da res publica; e os governos socialistas portugueses até ao dos dias de hoje, não têm sido capazes de concretizar uma governação exemplar, isenta, eficaz e sobretudo com visão de médio e longo prazo.
Eu não estou tão contra, como outros, face à governação nestes longos meses de pandemia; houve falhas, houve um zig-zag acentuado - mas que país o não teve ? Muito bem nos safámos nós que somos por tradição dados às baldas - e veja-se o que aconteceu com o afrouxamento das medidas pelo Natal, em que todos os Partidos concordaram para virem depois acusar essa fragilidade que teve consequências trágicas em termos sanitários, económicos e sociais. Desde a OMS até à UE todos têm andado aos zig-sagues, e assiste-se agora a esta pouca vergonha das empresas farmacêuticas multinacionais - o supra sumo do neoliberalismo e do mercado livre sem regulação - a lucrarem biliões com o negócio da saúde pública e a prometerem que entregavam aquilo que sabiam que não seriam capazes de entregar, mas fecharam o negócio !
O que é mais grave nesta governação dita "de esquerda" é a incompetência de muitos ministros, a conivência em trapalhadas monumentais, o amiguismo e o círculo fechado do António Costa como forma de sobreviver dentro do saco de gatos que é o PS -a hipocrisia de políticas que envergonham a esquerda e deviam ser exemplares, sérias e transparentes e é a falta de, como já disse atrás, políticas de médio e longo prazo quer na industrialização quer sobretudo no sector primário e do Ambiente e qualidade de vida. Havemos de falar nisso.
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