Florestas e matas
No passado dia 8 saiu um artigo no Publico de um engº silvicultor que, diga-se, assumiu que era do sector das celuloses e que, talvez por simplificação, tinha algumas deturpações da terminologia como sejam as "florestas de produção" referindo-se às nossas matas de produção de pinhal e eucalipto. No dia seguinte, 9 de Julho, enviei ao Publico um texto em que explicava que era útil um contraditório ao citado artigo, para esclarecer conceitos.
Até hoje não se deu a publicação, e portanto fica aqui dito que corto toda a colaboração com este jornal. nunca mais escrevo uma linha que seja para o Publico, que continuo a achar um bom jornal face ao panorama da concorrência - e estão no pleno direito de publicar só o que entenderem, até podem invocar que o meu texto está em mau português, etc. Mas como se trata de pessoas que conheço desde há muito, uma palavra a explicar teria ficado bem.
Assim, porque estou farto deste comportamento, nunca mais enviarei uma linha para o PUBLICO, nem a pedido. Segue o artigo excluído.
Matas de protecção e florestas e matas de protecção
A floresta e a mata produzem bens, algumas bens e serviços e outras essencialmente serviços.
Chamar correntemente floresta a todos os povoamentos arbóreos é uma simplificação ( digamos assim). Tal como se designavam - quando existiam- os Serviços Florestais (SF).
Isto e o que se segue são verdades de La Palice, mas creio não fazer mal nenhum, de vez em quando, refrescar os conceitos e afastar as confusões - e há alguma opinião púbica que anda confusa.
Floresta é um sistema natural complexo, onde coexistem diversas espécies arbóreas, com diferentes estados de desenvolvimento, arbustos e herbáceas, criando vários andares de vegetação. Quando o homem intervêm e se dedica a explorar a floresta, retira sobretudo as espécies com maior valor comercial consoante o uso a dar ao material lenhoso.
A necessidade de aumentar as áreas das espécies mais interessantes levou à criação de novos povoamentos, em regra monoespecíficos - as matas. Isto é entendido assim há pelo menos uns dois milénios quando os romanos criaram no seu Direito as categorias de ordenamento do território ager, saltus e silva ; e havia ainda o paúl, áreas de floresta por explorar geralmente nos vales e sujeitos a cheias. Por isso hoje, p.e. em Portugal, quando se plantam matas de pinheiro bravo ou de eucalipto não se estão a criar florestas mas sim matas - a mata é o oposto da floresta.
No pinhal, sobretudo se não for demasiado denso, ainda se conseguem estabelecer andares sub-arbustivos e herbáceos e alguma fauna encontra neles habitat de sobrevivência (saudoso Pinhal de Leiria); mas nos eucaliptais, então com a densidade com que são em regra plantados, nada mais cresce nem a fauna encontra condições para se fixar.
Vamos então assentar : precisamos de matas de produção que visam essencialmente oferecer madeira e os pinhais ainda a resina. E vamos aqui deixar de lado os sobreirais e azinhais e respectivos montados.
Mas precisamos de manter o pouco que resta das florestas naturais de protecção e, indo mais longe, plantar matas equilibradas para protecção das tão faladas cabeceiras das bacias hidrográficas e encostas muito declivosas . e essas fornecem sobretudo serviços ao Ambiente.
Tudo isto pressupõe que exista uma política florestal nacional, pensada e gerida nacionalmente, embora lógica e indubitavelmente aplicada de perto aos níveis regional e local. Política florestal é o que não existe em Portugal desde que se extinguiram os SF e as Administrações Florestais que formavam uma quadrícula que cobria todo o nosso território. As consequências vêem-se todos os Estios...
Já cansa falar destas matérias perante os olhos cegos e os ouvidos surdos de quem nos governa e teve o desplante de acabar com a estrutura florestal nacional, e neste jornal, depois de, entre outros, o Prof. Jorge Paiva ter publicado aqui excelentes textos didácticos.
Só através de um ordenamento florestal cientificamente apoiado se poderá determinar, com vantagem para a economia e vantagem para a sustentabilidade, onde se poderá consentir a mata de produção e - não vale a pena aqui atacar ou defender o pinheiro e o eucalipto pois são por demais conhecidas as suas características e exigências. O que também não vale a pena é mistificar a opinião pública confundindo floresta e mata...
Ensinamos nas escolas e nas Universidades o que é a floresta e o que é o ecossistema florestal - ora a publicidade da indústria da celulose, por muito sofisticada que seja, não pode ( poder, pode, mas não deve...) confundir a opinião pública.
Todos sabemos quem acabou com os SF e com a política florestal que poderia corrigir os abusos, e porquê - mas isto as celuloses não dizem... !"
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Creio que foi nos finais da década de 80 do passado século, havia por aí espalhados uns cartazes enormes, promovidos pela industria da celulose, com uma fotografia dum eucaliptal e em letras garrafais o elogio à floresta.
Então dirigi uma carta ao Instituto da Defesa do Consumidor, que nessa altura ainda pontificava, denunciando precisamente esta falsa ideia que se estava a passar de que os eucaliptais eram florestas, por se tratar de publicidade enganosa. O certo é que recebi resposta a esta queixa e pouco tempo depois desapareceram os cartazes...
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